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sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Esquerdismo, fase superior do imperialismo

 
por Bruno Guigue
Le Grand Soir

O colapso da União Soviética significou o fim do comunismo? Aqueles que proferiram a oração fúnebre podem ter considerado os seus desejos realidade. Ao contrário do que acreditaram, o socialismo real não desapareceu de corpo e alma. O fato de a bandeira vermelha não pairar mais sobre o Kremlin não significa a sua extinção no planeta: 1,5 mil milhões de chineses vivem sob a liderança de um Partido Comunista que não mostra sinais de perder força. O Vietnã socialista está indo muito bem. Na Rússia, o Partido Comunista continua a ser a principal força de oposição. Os comunistas governam o Nepal e o estado indiano de Kerala. Apesar do bloqueio imperialista, os cubanos continuam construindo o socialismo. Os comunistas tiveram êxitos eleitorais no Chile e na Áustria. Dizer que o comunismo deixou apenas más lembranças e pertence a um passado longínquo é cometer um duplo erro de análise. Ele não somente contribuiu para o bem-estar de um quarto da humanidade, mas também não há indicação de que tenha dito a sua última palavra. Ele não está condenado pelo seu passado nem privado de um futuro. Pode registrar a seu crédito a luta vitoriosa contra o nazismo, uma contribuição decisiva para a queda do colonialismo e uma resistência obstinada ao imperialismo. Este triplo sucesso é suficiente para dar-lhe cartas de nobreza revolucionárias. O seu passado é também a longa série de avanços sociais e os milhões de vidas arrancadas da pobreza, analfabetismo e doenças.

O comunismo foi e é um esforço titânico para tirar as massas da ignorância e dependência. Permanecendo na URSS em 1925, o pedagogo Célestin Freinet expressou “sua surpresa e seu assombro, especialmente se considerarmos as condições em que este imenso progresso foi feito”. Pedagogos russos, escreveu ele, “encontraram na sua dedicação à causa do povo e na atividade revolucionária clareza suficiente não apenas para elevar a sua pedagogia ao nível da pedagogia ocidental, mas para ir mais além, e de longe, das nossas tímidas tentativas”. Nenhuma outra força política poderia ter tirado do subdesenvolvimento os países atrasados, coloniais e semicoloniais, pelos quais os comunistas foram responsáveis no século XX. O que seria a Rússia se tivesse permanecido nas mãos de Nicolau II ou Alexander Kerensky? O que seria a China se não tivesse escapado a Chiang Kai-shek e à sua camarilha feudal? Onde estaria Cuba se tivesse permanecido nas garras do imperialismo e seus mercenários locais? A revolução comunista em todos os lugares foi a resposta das massas proletarizadas à crise estrutural de sociedades em degradação, num cenário de atraso econômico e cultural. Se essa revolução aconteceu, foi porque respondeu às emergências da época. Na Rússia, na China e em outros lugares, foi fruto de um profundo movimento na sociedade, de um amadurecimento das condições objetivas. Mas sem o Partido, sem uma organização centralizada e disciplinada, tal resultado revolucionário seria impossível. Na ausência da liderança personificada pelos comunistas, com que vanguarda as massas poderiam ter contado? E por falta de alternativa, a que desespero teria levado o aborto das promessas revolucionárias?

O fato das formas de luta pelo socialismo não serem mais as mesmas não altera a questão. Esta luta ainda está viva ainda hoje. Os países capitalistas desenvolvidos estão em crise, e a única solução para essa crise é a formação de um bloco progressista em oposição ao bloco burguês. China, Vietnã, Laos, Síria, Cuba, Kerala, Nepal, Bolívia, Venezuela e Nicarágua estão a construir um socialismo original. Fingir ser comunista enquanto se lança um olhar desdenhoso para essas conquistas concretas é ridículo. Mas é o que fazem as incontáveis capelinhas do esquerdismo ocidental. O trabalho diário dos médicos cubanos, professores venezuelanos e enfermeiras nicaraguenses, a seus olhos, não atinge a dignidade da revolução mundial. Para esses “vestais” do fogo sagrado, tais conquistas são modestas demais para despertar o entusiasmo de um futuro brilhante. Guardiões intransigentes da pureza revolucionária, os esquerdistas adoram distribuir cartões vermelhos para aqueles que constroem o socialismo. Sem agirem em casa, ditam julgamentos sobre o que os outros fazem. E o pior é que aplicam os critérios da ideologia burguesa. Quando a Revolução Cubana derrubou Batista, os esquerdistas inventaram o slogan: “Cuba sim, Fidel não”. Com este slogan ridículo, reivindicaram defender a revolução enquanto condenavam a “ditadura castrista”. Mas o que é a Revolução Cubana sem o castrismo? E como assumir a via do socialismo, senão abafando uma oposição apoiada pelo imperialismo? A ofensiva ideológica contra Fidel Castro não refletiu apenas indiferença às condições da luta travada pelo povo cubano. Apoiou também tentativas de derrubar o poder revolucionário.

Durante os eventos de Tiananmen em junho de 1989, temos o mesmo cenário. Explodindo de entusiasmo pela rebelião, o comitê da Quarta Internacional proclama “a vitória da revolução política na China”. Ferida pela repressão que a atingiu, expressou a sua “solidariedade inabalável com os trabalhadores e estudantes que estão comprometidos numa luta impiedosa contra o regime estalinista assassino em Pequim”. Um “massacre sangrento” que mais uma vez revela “a depravação contrarrevolucionária do estalinismo, o mais insidioso e sinistro inimigo do socialismo e da classe operária”. Quando se conhece a substância do assunto, essa afirmação é estonteante. Porque “o Massacre de Tiananmen” é tema de uma narrativa particularmente falsa, impondo-se lembrar os fatos. Primeira distorção em relação à realidade:  a composição do movimento de protesto. As mídias ocidentais descrevem-no como um movimento monolítico, exortando o Partido Comunista a renunciar e pedindo o estabelecimento de uma “democracia liberal”. Isto está incorreto. A cuidadosa investigação publicada pela Mango Press em 4/junho/2021 aponta que o movimento inclui não apenas estudantes, “o grupo mais barulhento“, mas também “muitos operários, migrantes e trabalhadores rurais da região de Pequim, participando na ação, cada grupo tendo uma orientação política diferente. Alguns dos manifestantes eram marxistas-leninistas, outros maoistas radicais, outros liberais”. Segunda precisão, igualmente importante: “Esta não é uma conspiração sombria do governo chinês, mas um fato confirmado: uma operação conjunta MI6-CIA conhecida como Operação Yellowbird lançada para formar ‘facções pró-democraciaʼ. Tríades foram enviadas de Hong Kong para as universidades chinesas, para treinar estudantes na guerra de guerrilha, armando-os com bastões de ferro e ensinando-lhes táticas de rebelião. O objetivo final da Operação Yellowbird era infiltrar indivíduos no movimento de protesto, conseguindo infiltrar mais de 400”.

As declarações dos porta-vozes do movimento também são muito esclarecedoras. Os mais famosos no Ocidente são Chai Ling e Wang Dan. Como relata o documentário americano The Gate of Heavenly Peace. “Chai Ling foi entrevistada por Peter Cunningham em 28/maio/1989. Eis o que ela disse: “O tempo todo, guardei isto para mim porque, sendo chinesa, pensei que não deveria falar mal dos chineses. Mas não posso às vezes deixar de pensar — e dizer também — vocês, chineses, não valem a minha luta, não valem o meu sacrifício! O que realmente esperamos é derramamento de sangue quando o governo estiver pronto para massacrar descaradamente o povo. Somente quando a praça estiver inundada de sangue é que o povo chinês abrirá os olhos. Só então ele estará verdadeiramente unido. Mas como posso explicar tudo isto aos meus camaradas?” O ícone da Praça Tiananmen votava o seu povo ao martírio, mas optou pela fuga para os Estados Unidos via Hong Kong. Conclusão da Mango Press: “Obviamente, a liderança fabricada pelos serviços ocidentais para este protesto tinha um objetivo claro: criar as condições para um massacre na Praça Tiananmen. O protesto começou como uma demonstração de força pacífica para apoiar Hu Yaobang, mas foi cooptado por agentes estrangeiros”.

A forma como as autoridades chinesas finalmente restauraram a ordem faz parte da crítica do caso. Ao contrário da versão ocidental, mostraram grande moderação até que o motim estourou na noite de 3 a 4 de junho. De 16 de abril a 20 de maio, as manifestações puderam continuar sem contratempos. No dia 20 de maio, foi decretada a lei marcial e os manifestantes receberam ordem, por meio de noticiários e alto-falantes da praça, de voltar para suas casas. Algumas unidades militares tentaram entrar em Pequim, mas foram impedidas pelos manifestantes nas zonas de entrada. A 2 de junho, o exército fez a sua primeira tentativa de evacuar a Praça Tiananmen. As tropas do Exército de Popular de Libertação (EPL) enviadas para o local possuíam equipamento de choque rudimentar, apenas um em cada dez soldados armados com uma espingarda metralhadora. Seguindo ao longo da Avenida Chang'an, as tropas foram atacadas pela multidão. Alguns soldados foram desarmados, outros molestados pelos desordeiros. A tropa segue finalmente para a Praça Tiananmen, onde soldados desarmados persuadem os estudantes a irem embora. Mas na noite de 2 para 3 de junho, a violência explodiu nos becos e ao longo da Avenida Chang'an. Os desordeiros que confiscaram armas aos soldados estão ao ataque. Dezenas de veículos blindados são incendiados com coquetéis molotov e muitos soldados desarmados são capturados. De acordo com o Washington Post de 5/junho/1989, “os combatentes antigovernamentais estão organizados em formações de 100 a 150 pessoas. Eles estão armados com coquetéis molotov e bastões de ferro, para enfrentar o EPL, que ainda estava desarmado nos dias que antecederam 4 de junho”.

Barricadas são erguidas e os confrontos multiplicam-se. Em seguida, o motim transforma-se em massacre. Soldados capturados nos transportes de tropas são linchados ou queimados vivos, como o Tenente Liu Guogeng, o Soldado Cui Guozheng e o Primeiro Tenente Wang Jinwei. Em 3 de junho, o número de mortos já era de quinze soldados e quatro manifestantes. O governo então ordenou que o EPL recuperasse o controle das ruas. Durante a noite de 3 a 4 de junho, os militares entraram em massa na cidade e reprimiram o tumulto. Mas não houve combates na Praça Tiananmen. Nenhum tanque esmagou um manifestante. Após os acontecimentos de 4 de junho, o governo estimou o número de vítimas em 300 pessoas: soldados, policiais e manifestantes. Um recorde em que o mundo ocidental imediatamente qualificou como mentiroso: as mídias falaram de 1000 a 3000 e, finalmente, 10 mil vítimas. Uma semana depois, o governo chinês estabeleceu o número oficial de mortos em 203. Enquanto isto, a foto do homem parando a coluna de tanques na Praça Tiananmen percorre o mundo. Ilustra a bravura de um homem sozinho, diante de veículos blindados que simbolizam a brutalidade da repressão. Mas no vídeo completo, vemos que a coluna para de forma a não passar pelo corpo. O homem então sobe no primeiro tanque e bate na escotilha. Em seguida, desce lentamente do tanque e é levado pelos seus amigos que se lhe juntaram. Os tanques então continuam para Chang'an, voltando à sua base. Isso é tudo. O gênio propagandista fabricou um símbolo planetário com um não-evento.

“O relato dos eventos pelas mídias ocidentais, liberais e ditas livres, não faz sentido”, conclui o artigo da Mango Press. “Não há uma explicação da razão pela qual os alunos protestaram na Praça e muito raramente há uma discussão sobre os objetivos muito díspares dos grupos de alunos. Se acreditarmos que uma coluna de tanques para por causa de um homem, após o assassinato de 10.000, que mentiras ainda mais ridículas o Ocidente escreverá sobre a China?”. Na Praça Tiananmen em 4/junho/1989, não houve massacre. Houve combates intensos nas ruas laterais entre os elementos armados contrarrevolucionários, a polícia e o exército. O número de mortos em todo o evento foi de 241 no total, incluindo soldados, policias e manifestantes. Apesar da violência, não houve execuções. Wang Dan, líder do protesto e instigador da violência, não conseguiu fugir para o Ocidente e foi preso. Foi condenado a quatro anos de prisão, mais dois anos de detenção enquanto aguardou o julgamento por incitar a violência contrarrevolucionária. O homem recebeu apenas seis anos de prisão. Agora vive livremente no maravilhoso mundo do ocidente capitalista. O verdadeiro motivo pelo qual o Ocidente é forçado a mentir sobre os eventos de hoje é para salvar a face. Tentaram derrubar o governo soberano da China através da violência fascista, a sua tentativa de golpe foi esmagada”.

Não poderíamos dizer melhor. Mas a realidade da interferência imperialista e a nocividade das suas mentiras escapam ao radar da esquerda radical. Contaminada por um trotskismo de baixo nível que faria o próprio Trotsky corar de vergonha, obstina-se tanto mais contra os Estados socialistas quanto é totalmente inofensiva para os Estados capitalistas. Impotente e marginalizada nos seus países, exala o ressentimento contra o socialismo real. Incapaz de compreender a importância da questão nacional, despreza o anti-imperialismo legado pelos nacionalismos revolucionários do Terceiro Mundo e pelo movimento comunista internacional. Em vez de se por na escola de Ho Chi Minh, Lumumba, Sankara, Mandela, Castro, Nasser, Che Guevara, Chávez e Morales, lê o Le Monde e assiste à France 24. Acredita que há bons e maus, que os bons são como eles e que é preciso dar pancada nos maus. Fica indignada — ou incomodada — quando o chefe da direita venezuelana, treinado nos Estados Unidos pelos neocons para eliminar o chavismo, é preso por tentativa de golpe. Quando o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) enfrenta dificuldades eleitorais, grita a par dos lobos imperialistas e apressa-se a denunciar alegados “abusos”. Finge não saber que a ruptura do abastecimento foi causada por uma burguesia importadora que negocia em dólares e organiza a paralisação das redes de distribuição na esperança de minar a legitimidade do presidente Maduro. Indiferente aos movimentos de fundo, esta esquerda contenta-se em participar na agitação à superfície, como se para ela a política não fosse um campo de forças, mas um teatro de sombras. Não admira, então, que passe ao lado das lições dadas pelas tentativas de desestabilização que se abatem sem cessar sobre a Revolução Bolivariana.

A primeira lição é que não se pode construir uma alternativa política sem correr o risco de um confronto decisivo com os donos do capital, estejam eles dentro ou fora das fronteiras. Por alternativa política, entenderemos exatamente o oposto do que se denomina “alternância”, ou seja, a simples troca de equipes no poder. É um processo muito mais profundo, que não se contenta com apenas algumas modificações superficiais, mas que põe em ação explicitamente as estruturas que determinam a distribuição da riqueza. Esta alternativa política identifica-se, portanto, com a retoma expressa pelo povo dos atributos da soberania. Pressupõe o rompimento dos laços que ligam o país ao capital estrangeiro dominante e ao capital comprador local que dele depende. Mas é uma tarefa colossal. Mal empreendido, o peso objetivo das estruturas é combinado com a guerra encarniçada travada pelos ricos para manter seus privilégios de classe. A imprensa internacional descreve a Venezuela como um país falido, mas esquece-se de precisar que essa falência é a de um país capitalista latino-americano. O país fez progressos significativos, mas a falta de transformação estrutural deixou-o no sulco da dependência econômica. Arruinado pela queda dos preços do petróleo, não soube — ou não pôde — construir um modelo alternativo. Se os bandidos da direita venezuelana se soltam nas ruas de Caracas sob os aplausos da imprensa burguesa e das chancelarias ocidentais, é porque a Venezuela não é Cuba. E se a Venezuela tivesse embarcado num processo de desenvolvimento autônomo não capitalista, provavelmente não haveria bandidos em Caracas.

A crise no na Venezuela tende a fazer as pessoas esquecerem, mas o chavismo foi apoiado por um poderoso movimento social que está longe de ter desaparecido. Desde a primeira eleição de Chávez, em 1998, ele lutou contra os preconceitos raciais e de classe. Reduziu dramaticamente a pobreza e o analfabetismo. Nacionalizando o petróleo, restaurou o controle dos recursos naturais para a nação. Alterando a política externa do país, rompeu com Israel, constituiu a aliança bolivariana e desafiou o Tio Sam no seio de seu “quintal” sul-americano. Aprovado pelo povo venezuelano, o chavismo abalou a desordem secular da América Latina em proveito das multinacionais norte-americanas e da burguesia racista. Claro que a Revolução Bolivariana não erradicou todos os males da sociedade venezuelana da noite para o dia e traz consigo a sua quota de erros e imperfeições. Usou o maná do petróleo para tirar da pobreza as camadas sociais mais desfavorecidas, mas desistiu de transformar as profundas estruturas sociais do país. Uma nova burguesia aproveitou a sua proximidade com o poder para capturar benefícios e consolidar privilégios. Pior ainda, a economia está nas mãos de uma burguesia reacionária que organiza a sabotagem para intensificar a crise e tirar Maduro do poder.

Mas de qualquer forma, a Revolução Bolivariana não tinha revolução só no nome, por isso só poderia desencadear o ódio vingativo dos ricos e despertar a hostilidade mortal de seus oponentes. Quando a esquerda ocidental se indigna com as — alegadas — vítimas da repressão policial em vez das operações sangrentas da ultradireita, esquece que um protesto de rua nem sempre é progressista, que uma exigência democrática pode servir de cartaz para a reação e uma greve pode contribuir para a desestabilização de um governo de esquerda, como demonstrou o movimento caminhoneiro chileno em 1973. A lição foi esquecida pela esquerda aburguesada dos países ricos, mas os verdadeiros progressistas latino-americanos sabem disso: se nós queremos mudar o curso das coisas, devemos agir sobre as estruturas. Nacionalização de setores-chave, rejeição das receitas neoliberais, restauração da independência nacional, consolidação de uma aliança internacional de Estados soberanos, mobilização popular para uma melhor distribuição da riqueza, educação e saúde para todos, são as diferentes facetas do projeto progressista. Ao contrário do que afirma uma ideologia que recicla as velhas loas da social-democracia, não é o radicalismo que condena o projeto à derrota, mas o medo de assumi-lo. Uma revolução raramente perece por excesso de comunismo, mas muito mais frequentemente, pela sua incapacidade de conduzi-lo.

Assim que ataca os interesses geopolíticos e geoeconômicos das potências dominantes, o projeto progressista cruza a linha vermelha. Uma vez ultrapassado, qualquer imprudência pode tornar-se fatal. O imperialismo e seus implementadores locais não oferecem brindes. Franco não deu nenhuma oportunidade à República Espanhola (1936), nem a CIA a Mossadegh (1953), nem Mobutu a Lumumba (1961), nem Suharto a Sukarno (1965). Allende cometeu o trágico erro de nomear Pinochet para o Ministério da Defesa e Chávez deveu sua salvação em 2002 à lealdade da guarda presidencial. Não basta estar ao lado do povo, devemos proporcionar-nos os meios para não perdê-lo, deixando que nossos inimigos ganhem a vantagem. Como disse Pascal, não basta que a justiça seja justa, ela também deve ser forte. Tantas questões para as quais a esquerda ocidental finge não entender nada.

Pseudo-internacionalista, recusa-se a ver que o respeito pela soberania dos Estados não é uma questão acessória e que é a principal reivindicação dos povos diante das reivindicações hegemônicas de um Ocidente em vassalagem perante Washington. Pretende ignorar que a ideologia dos direitos humanos serve de cortina para o intervencionismo ocidental, principalmente interessado em hidrocarbonetos e riqueza mineral. Faz campanha pelas minorias oprimidas em todo o mundo, sem perguntar por que algumas são mais visíveis do que outras. Prefere os curdos sírios aos sírios, simplesmente por serem minoria, sem ver que essa preferência serve à instrumentalização por Washington e endossa o desmembramento da Síria de acordo com o projeto neoconservador.

Procuraremos por muito tempo na literatura da esquerda ocidental, artigos que expliquem por que em Cuba, apesar do bloqueio, a mortalidade infantil é menor que a dos Estados Unidos, a expectativa de vida é a de um país desenvolvido, a alfabetização é de 98% e há 48% de mulheres na Assembleia do Poder Popular. Nunca leremos por que Kerala, este estado de 34 milhões de pessoas governado pelos comunistas e seus aliados desde a década de 1950, tem de longe o maior índice de desenvolvimento humano na Índia, e por que as mulheres desempenham um papel social e político de liderança. As experiências de transformação social realizadas longe dos holofotes, em países exóticos dificilmente interessam a esses progressistas fascinados pela escória televisiva. Movida pela moral, intoxicada pelo formalismo pequeno-burguês, a esquerda ocidental assina petições e lança anátemas contra chefes de Estado que têm o infeliz hábito de defender a soberania dos seus países. Este maniqueísmo elimina a dolorosa tarefa de analisar cada situação concreta e de olhar além da ponta do nariz. Age como se o mundo fosse um, homogêneo, atravessado pelas mesmas ideias, como se todas as sociedades obedecessem aos mesmos princípios antropológicos, evoluindo segundo os mesmos ritmos. Ela prontamente confunde o direito dos povos à autodeterminação com o dever dos estados cumprirem as exigências do Ocidente que se apresenta como juiz supremo.

No drama sírio, este tropismo neocolonial levou a extrema esquerda a desviar-se pateticamente. Praticando a negação da realidade, engoliu avidamente a falsa versão das mídias ocidentais. Baseou-se em fontes questionáveis cujos números não verificáveis e afirmações gratuitas repetiu continuamente. Disciplinadamente, acreditou na narração ridícula do carniceiro-de-Damasco-que-massacra-seu-povo. Acreditou sem pestanejar na false-flag do ataque químico como engoliu a mistela onusiana do Sr. Powell. Caiu na armadilha da propaganda humanitária que descaradamente faz a triagem entre as boas e as más vítimas. A espantosa cegueira desta esquerda (como a) francesa deve-se, antes de mais, à sua postura moral indecifrável. Uma grelha de leitura maniqueísta entorpeceu a sua mente crítica, isolou-a do mundo real. Desesperada para identificar os bons (rebeldes) e o mau (Assad), recusou-se a entender um processo que ocorre noutro lugar que não no limbo das suas ideias. Quando se designam os protagonistas de uma dada situação histórica usando categorias como bem e mal, descartamos toda racionalidade. Certamente podemos ter preferências, mas quando essas preferências inibem o pensamento crítico, deixam de ser preferências, são inibições mentais.

A segunda razão para esta cegueira decorre de uma falta abissal de análise política. Essa esquerda radical não quis ver que o equilíbrio de poder na Síria não era aquilo em que acreditava. Reconstruiu a narrativa dos eventos como achou por bem dar forma à fantasia de uma revolução árabe generalizada que varreria o regime de Damasco como havia varrido outros, ignorando precisamente o que tornava única a situação síria. Aqueles que se orgulham de conhecer os clássicos deveriam ter aplicado a fórmula com a qual Lênin definiu o marxismo: “a análise concreta de uma situação concreta”. Em vez de se submeter a esse exercício de humildade diante da realidade, a extrema esquerda ocidental acreditou ver o que tinha vontade de ver. Abusando da sua própria retórica, apostava numa onda revolucionária que varreria tudo no seu caminho, como na Tunísia e no Egito. Ruim escolha. Privada de uma base social consistente no país, a gloriosa “revolução síria” não estava próxima. Uma verdadeira farsa sangrenta, uma invasão de desesperados tomou seu lugar. Esta invasão do berço da civilização por hordas de gente sem cérebro tomou o lugar, na imaginação esquerdista, de uma revolução proletária. O movimento trotskista não queria ver que as manifestações populares mais marcantes de 2011 foram a favor de Bashar Al-Assad. Desdenhosamente rejeitou a posição do Partido Comunista Sírio, que se aliou ao governo na defesa da nação síria contra seus agressores. Empurrando a negação da realidade para as fronteiras do absurdo, este esquerdismo declarou-se solidário, até ao fim, com uma “revolução síria” que existia apenas na sua imaginação.

O secretário-geral do Partido Comunista Sírio, Ammar Bagdash, respondeu antecipadamente em 2013: “Na Síria, ao contrário do Iraque e da Líbia, sempre houve uma forte aliança nacional. Os comunistas trabalham com o governo desde 1966, sem interrupção. A Síria não poderia ter resistido confiando apenas nos militares. Ela resistiu porque pôde contar com uma base popular. Além disso, contou com a aliança do Irã, da China, da Rússia. E se a Síria continuar de pé, “tronos” cairão porque ficará claro que existem outras vias. A nossa luta é internacionalista. Disse-me um especialista russo: o papel da Síria é como o da Espanha contra o fascismo”. Teste cruel para o esquerdismo europeu. Para analisar a situação síria, um comunista sírio que contribui para a defesa de seu país será sempre melhor do que um esquerdista francês que fantasia a revolução num bar do Quartier Latin. Incapaz de compreender o que se passa no local, a extrema esquerda é vítima de um teatro de sombras para o qual escreveu um guião imaginário. Não ouviu o que os marxistas locais estavam a dizer-lhe, representou a revolução por procuração, sem perceber que essa revolução só existia nos seus sonhos. Visto que o mito da oposição democrática e não violenta tinha que ser preservado, o relato dos eventos foi expurgado de qualquer coisa que pudesse alterar sua pureza. A violência dos ativistas wahhabistas foi mascarada com um dilúvio de propaganda. As provas do terrorismo, uma explosão de ódio, verdadeira face dessa falsa revolução, foi apagada dos ecrãs. Da mesma forma, essa esquerda bem pensante desviou hipocritamente o olhar quando os fogos da guerra civil foram atiçados por uma avalanche de dólares das petromonarquias.

Pior ainda, fez vista grossa à perversidade das potências ocidentais que apostaram na escalada do conflito incentivando a militarização da oposição, enquanto uma imprensa recebendo ordens profetizava com alegria a queda iminente do “regime sírio”. Sem vergonha, esta esquerda decalcou a sua leitura parcial do conflito sobre a agenda atlantista de “mudança de regime” exigida pelos neoconservadores. Enquanto se autodenominava anticolonialista, deixou-se arregimentar por um imperialismo determinado a causar o caos num dos poucos países árabes não comprometido com o ocupante sionista. A história lembrará que a esquerda radical serviu de respaldo à OTAN na tentativa de destruir um Estado soberano sob o falso pretexto dos direitos humanos. Mas é verdade que ao movimento trotskista nunca têm faltado argumentos. Para o acadêmico Gilbert Achcar, a causa é compreendida seguindo o “roteiro” da Guerra Fria, o novo roteiro consiste em apoiar “qualquer regime que seja objeto de hostilidade de Washington”. A lógica era: “o inimigo do meu amigo (a URSS) é meu inimigo”; o novo roteiro é: “o inimigo do meu inimigo (os Estados Unidos) é meu amigo”. Segundo ele, uma receita para o “cinismo sem limites”, esta atitude política “centrada exclusivamente no ódio ao governo dos Estados Unidos”. Pior, isso levaria a “oposição sistemática a qualquer coisa que Washington faça no cenário mundial e levaria a um apoio crítico para regimes totalmente reacionários e não democráticos, como o sinistro governo capitalista e imperialista da Rússia (imperialista de acordo com todas as definições do termo)”.

Gostaríamos de conhecer essas “definições” de imperialismo, mas nunca o saberemos. A Rússia não invade nenhum território estrangeiro, não impõe a outros Estados nenhum embargo, não pratica nenhuma “mudança de regime”. O orçamento militar da Rússia é 8% do da OTAN. A Rússia tem quatro bases militares no exterior, enquanto os EUA têm 725. O retorno da Crimeia ao regaço russo não é mais chocante do que a adesão do Havaí aos Estados Unidos ou a adesão de Mayotte à França. Mas é diante da tragédia síria que Gilbert Achcar exala a sua hostilidade para com Moscou. A intervenção russa, de fato, prestou uma ajuda inestimável ao Estado sírio na reconquista do território nacional às milícias extremistas apoiadas pelos países da OTAN. A acusação não comprovada contra a Rússia é então acompanhada, de forma bastante lógica, por uma absolvição dos Estados Unidos: “Washington manteve-se discreto na guerra na Síria, apenas intensificando a sua intervenção quando o chamado Estado Islâmico lançou uma grande ofensiva e cruzou a fronteira com o Iraque, após a qual Washington limitou sua intervenção direta na luta contra o ISIS”. Perfil discreto dos Estados Unidos na guerra na Síria? Obviamente, Gilbert Achcar nunca ouviu falar dos (falsos) “Amigos da Síria”, do plano de Wolfowitz de pulverizar o Oriente Médio em entidades religiosas, da operação “Timber Sycamore”, dos milhares de milhões de dólares pagos à nebulosa jihadista via CIA, das entregas de armas por países ocidentais a milícias extremistas e o embargo infligido ao povo sírio, privado de medicamentos por democracias corajosas que escoam o seu material de guerra para os reis do petróleo.

Pior ainda, lemos nos escritos do acadêmico de esquerda que “a influência mais decisiva de Washington na guerra na Síria não foi a sua intervenção direta — de importância primária apenas para os “novos roteiristas”, focados exclusivamente no imperialismo ocidental — mas sim proibindo os seus aliados regionais de entregarem armas antiaéreas aos rebeldes sírios, principalmente devido à oposição de Israel”. Portanto, o papel de Washington, sob a influência benéfica de Israel, foi privar esses pobres rebeldes de armas antiaéreas que teriam permitido lutar contra o exército de Bashar Al-Assad. É preciso realmente estar obcecado pelo “imperialismo ocidental”, que o autor coloca entre aspas, para imaginar que os Estados Unidos têm algo a ver com a guerra na Síria. De fato, Gilbert Achcar transpõe para o caso americano a tese absurda do estudioso pró-islamista François Burgat a respeito das petromonarquias: elas não desempenharam nenhum papel no drama sírio, é bem conhecido. Quanto ao papel de Israel, único Estado a bombardear a Síria continuamente desde 2012, Achcar apenas o menciona para ilibá-lo. Com tais suposições, não é surpreendente que a maioria das organizações de esquerda tenha feito campanha pela “revolução síria”, apoiando entusiasticamente uma oposição fantoche paga pelos Estados Unidos, exigiram entregas de armas antiaéreas aos “simpáticos rebeldes”, imploraram à OTAN para bombardear a Síria com mísseis, reprovaram os governos ocidentais por não terem destruído o legítimo Estado sírio, gritaram contra a Rússia, China e Irã, claramente culpados a seus olhos, por defenderem um Estado soberano atacado por hordas de mercenários lobotomizados.

Se insistimos no caso da Síria, é por destacar o colapso de uma esquerda que às vezes se afirma “comunista”, embora atenda aos desejos de seus piores inimigos. Tal como Trotsky pedindo a “liquidação” do grupo dominante soviético em 1939, esta esquerda pseudorrevolucionária serviu os interesses imperialistas com dedicação inabalável. Influente em alguns meios de comunicação, espalhou uma falsa imagem dos Estados e governos visados por Washington. Em 2020, bastou o secretário de Estado dos EUA acusar o governo chinês de “genocídio” em Xinjiang para o Liberation publicar na primeira página: “Em Xinjiang, genocídio em andamento”. A submissão desta chamada imprensa livre à agenda imperialista atingiu níveis sem precedentes. Liderada por ex-esquerdistas, ela analisa todos os governos que desagradam a Washington por meio de uma jurisdição de direitos humanos cujas regras são definidas pelo Congresso dos Estados Unidos. A demonização de Hugo Chávez, Nicolas Maduro, Daniel Ortega e Evo Morales coexiste com a de Xi Jinping, Vladimir Putin, Bashar Al-Assad e Kim Jong-un, todos culpados de defenderem a soberania dos seus países. Basta imputar-lhes uma violência real ou imaginária contra oponentes ou jornalistas para torná-los tiranos impiedosos e sem princípios, incorrendo na ira vingativa do mundo livre e do seu braço armado, os EUA. Nesta configuração ideológica, o imperialismo toma como pretexto a defesa dos direitos humanos para desestabilizar os Estados recalcitrantes. A ideologia esquerdista assume a função de cobrir essa ingerência com vestes progressistas.

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[0] O original, “Le gauchisme, stade suprême de l’impérialisme”, encontra-se em Le Grand Soir. Tradução original de Resistir.info.
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segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Não é hora de criticar Lula?


por Gabriel Landi Fazzio
LavraPalavra

Não é raro confundirmos nossos desejos com a realidade. Entendo e compartilho com qualquer trabalhador(a) consciente o desejo pela construção da mais massiva e vigorosa unidade da classe proletária. Compreendo também que pareça óbvio, e mais fácil, começar a unidade “do maior para o menor”, e considerar indispensáveis aquelas organizações e personalidades mais influentes entre os trabalhadores – mesmo quando essas organizações e personalidades assumidamente não desejam limitar-se à unidade independente da classe trabalhadora e, ao contrário, costuram acordos amplos com a burguesia brasileira, dando de barato que o resto da esquerda lhes seguirá a reboque. O que não consigo compreender, então, é como seria possível alegar o desejo por uma “unidade da esquerda sem a direita” e renunciar à agitação de denúncia de todas as manobras políticas que impeçam essa unidade da esquerda sem a direita. Afinal, cada vez que Lula ou um dirigente petista sinalizam alianças com a burguesia, eles sabotam a “unidade da esquerda sem a direita”, correto?

Mas aqui temos um problema, já que as várias camadas da classe proletária tomam consciência a ritmos desiguais (mantenhamos essa ideia em mente) da inviabilidade imediata daquele desejo inicial. Se as organizações maiores e mais influentes não desejam uma unidade apenas com a “esquerda” (com as organizações dos trabalhadores e do povo pobre), então os setores da classe trabalhadora que mantém levantada essa bandeira são forçados a uma escolha: ou, em nome da unidade de todas as organizações de esquerda, engolir a aliança com a direita; ou, em nome da independência de classe do proletariado, organizar essa unidade entre aqueles que assim a desejam – e quem deseja a aliança com a direita que a faça sem nós.

Isso é bem evidente, e não devemos ter muita dúvida de como a maioria da classe trabalhadora (desorganizada, enfraquecida e desorientada ideologicamente pela política de conciliação de classes) tende a se posicionar diante dessa encruzilhada: aceitando as alianças com partidos burgueses em nome de assegurar a vitória contra Bolsonaro. Organizações como o PCO têm o mérito, ao menos, de serem bastante francas quanto a isso: seu reboquismo a Lula e ao PT é incondicional e desesperado, e por isso sequer questionam ou propõem quaisquer alianças que não aquelas que o próprio Lula já deseje. Outras organizações, no entanto, vêm ensaiando um reboquismo um pouco mais sutil, disfarçado de “entrismo nas bases petistas” (algo que o PCO sem dúvida também pretende estar fazendo, e talvez faça até melhor). Nas sintéticas palavras do dirigente nacional e publicista da Resistência, Gabriel Casoni:

A maioria do povo trabalhador quer Lula de volta. Lula quer alianças amplas para ganhar as eleições e governar. A maioria dos trabalhadores vê em Lula a alternativa para derrotar Bolsonaro. Lula negocia alianças regionais com líderes do centrão no Nordeste. […] Porém, defender o nome de Lula, sem criticar sua política de alianças e limitações programáticas, significa ceder ao pragmatismo petista e ao programa da conciliação de classes, que já demonstraram sua falência estratégica no golpe de 2016, que foi liderado pelos antigos ‘aliados’ da direita contra Dilma. É possível combinar o diálogo com o povo trabalhador que quer derrotar Bolsonaro votando em Lula sem abrir mão da política combativa e de um programa realmente de esquerda? Sem nenhuma dúvida. A política da Resistência, corrente interna do PSOL, busca exatamente responder a esse desafio. Precisamos de uma Frente de Esquerda, nas lutas e nas eleições, para derrotar Bolsonaro — nada é mais importante que isso. Lula é o melhor nome para encabeçar essa Frente, pela sua autoridade e influência junto às grandes massas populares. Mas discordamos da sua política de alianças e dos limites do seu programa. Apresentamos ao debate público outra linha de alianças e outra base programática. Não achamos que vamos convencer Lula da estratégia e programa anticapitalistas, mas queremos, com essa linha política tática, abrir diálogo com os setores mais conscientes do nosso povo.[1]

Em resumo, a posição da Resistência é essa: sabem que Lula fará de tudo para sabotar uma “unidade da esquerda sem a direita”, e sabem que deixar de criticá-lo por isso significa ceder ao petismo e ao programa de conciliação de classes. Será que pretendem, então, em nome da “unidade da esquerda sem a direita”, promover uma ampla agitação a fim de convencer a maioria dos trabalhadores dessa simples verdade – de que Lula sabota esse projeto de forma diária e sistemática? Não, pois criticar Lula dificulta o “diálogo” que pretendem abrir “com os setores mais conscientes do nosso povo” – curiosamente, na visão da Resistência “os setores mais conscientes do povo” são justamente aqueles mais próximos da zona de influência da política de conciliação de classes. Essa fraseologia adulatória não esconde suas intenções...

“É possível combinar o diálogo com o povo trabalhador que quer derrotar Bolsonaro votando em Lula sem abrir mão da política combativa e de um programa realmente de esquerda?”, pergunta-se o propagandista da Resistência. E responde sem hesitar: “Sem dúvida”. Mas, a despeito dessa resposta segura, a verdade é que “o povo trabalhador que quer derrotar Bolsonaro votando em Lula” não é um todo homogêneo: ele não é apenas composto daqueles que desejam “derrotar Bolsonaro votando em Lula sem abrir mão da política combativa”, mas também por imensas camadas de pessoas que se mostram dispostas a abrir mão de uma política combativa em nome de derrotar Bolsonaro votando em Lula. Gente que votaria em Ciro, em Dória, em suma, em qualquer um contra Bolsonaro. Eis o quão longe o pragmatismo petista já levou parcelas de suas bases. Como demarcar uns dos outros, os “petistas combativos” dos “pragmáticos”? Como contribuir para fazer os melhores dentre esses elementos avançarem para longe dos outros, se diferenciando? Isso a Resistência não responde, e pelo contrário: amarra suas mãos, renunciando à tarefa histórica de toda militância que deseja ser revolucionária não só em palavras, mas em ações – o trabalho de elevação e diferenciação das camadas do proletariado por meio da agitação de denúncia, da propaganda teórica e da organização independente.

“Precisamos de uma Frente de Esquerda, nas lutas e nas eleições, para derrotar Bolsonaro — nada é mais importante que isso”, afirma Gabriel com segurança. Mas, na visão de Lula e de milhares de seus apoiadores, o mais importante é derrotar Bolsonaro, e a Frente de Esquerda em nada contribui para isso – o que contribui, acreditam, são as alianças com a direita! De alguma forma, portanto, a Resistência sabe que Lula é incapaz de encabeçar essa política que a Resistência propõe – mas precisa fazer reverências a Lula como “o melhor nome para encabeçar essa Frente”, em nome de “abrir diálogo” com os defensores de Lula na base do movimento operário e popular.

Em síntese: Lula acredita que sua política de conciliação de classes seja a mais eficiente para derrotar eleitoralmente Bolsonaro (e manter-se no governo depois, é claro, por meio de uma política de conciliação). A Resistência pensa diferente disso – mas (em nome de não ofender a sensibilidade dos petistas) abre mão de denunciar a sabotagem de Lula à independência de classe do proletariado unido. Tudo em nome de um momento (podemos supor, sendo generosos com os socialistas-e-libertários da Resistência) em que Lula anunciará formalmente o seu vice burguês, ou coisa que o valha, e então a Resistência poderá “mostrar pela prova da prática” que Lula não deseja a independência anticapitalista dos trabalhadores – mesmo que isso signifique, até lá, renunciar a promover uma intensa agitação com base em todo o material factual que Lula já forneceu ao longo de décadas, e que segue oferecendo, que comprova pela sua própria prática sua limitação convicta ao reformismo do capitalismo.

Curiosamente, essa tal “prova da prática” ocupa lugar central na tática da Resistência. Mas, aqui, ela parece produzir efeitos sobre a consciência espontaneamente; como se a “prova da prática” não produzisse seus efeitos sobre a consciência justamente e apenas quando é acompanhada por uma vigorosa agitação e propaganda da vanguarda entre as massas. O raciocínio é de um espontaneísmo da consciência que sai pela culatra: enquanto sua agitação reforça nos trabalhadores a ilusão de que é possível uma Frente de Esquerda anticapitalista com Lula (em vez de combater essa ilusão), a mesma corrente espera por um momento catártico em que a prática demonstrará “por si mesma” que devemos apostar numa estratégia anticapitalista, e não em Lula. Fica a questão: se todas as traições de Lula ainda não “provaram pela prática” isso, de que modo seria diferente dessa vez?

Não há dúvidas de que o raciocínio da Resistência tem validade, e pode inclusive lhe render frutos, como tem rendido ao PCO – mas dificilmente a validade dessa tática envolveria “as camadas mais conscientes do povo”, como acreditam. Pelo contrário, essa política tende a aproximar a Resistência daquelas camadas mais atrasadas e conciliatórias do movimento dos trabalhadores: não só daquelas camadas lulistas absolutamente indiferentes a uma política anticapitalista, mas em especial de todo o vasto pântano centrista daqueles que juram, de forma “bem-intencionada”, que são anticapitalistas, socialistas, comunistas e marxistas, mas… como “a revolução está muito longe”, vão sendo lulistas “por enquanto”. E, em vez de contribuir para mostrar a essas camadas (de fato, “as mais conscientes”, mas apenas em relação aos demais setores reformistas, e não no geral) a inviabilidade de conciliar lulismo e anticapitalismo… a Resistência tranquiliza essas camadas, afirmando que é bem possível sim tal mediação, bastando um diálogo “sem ultimatos”, nos dizeres do companheiro Valério Arcary[7].

E se não bastasse silenciar diante da sabotagem lulista à “frente de esquerda sem a direita”… a Resistência acredita que é o PCB, com a denúncia desta sabotagem, quem sabota a Frente Única. Nessa visão, não é a maioria reformista que sabota a Frente Única Operária para a luta de massas em nome de ir apenas desgastando eleitoralmente Bolsonaro rumo a 2022, mas justamente quem denuncia essa sabotagem, na verdade, que sabota a unidade de ação! Isso só pode fazer sentido para quem já há muito tempo borrou as fronteiras entre a Frente Única Proletária nas lutas extraparlamentares e a mera frente eleitoral com o social-liberalismo. Nós, sabendo que as duas coisas não são a mesma, não nos intimidamos com essa fraseologia esquerdista para encobrir políticas centristas: a Frente Única Proletária tem apenas a ganhar com a mais intensa agitação e demarcação entre seus elementos, de modo que sejam os elementos mais ativos e avançados a pautar a dinâmica da ação, e não os mais inertes e atrasados a, com seu peso predominante, deter e protelar a ação. A Resistência tem medo de que as críticas afugentem os petistas da luta – o que só prova a inconsistência da suposta “combatividade petista”. Ainda assim, apostam todas suas fichas nesse mesmo setor, que julgam ser “o mais consciente de nosso povo”…

Como já disse, se a maioria reformista das direções de esquerda deseja uma unidade com a direita, aqueles que desejam uma Frente de Esquerda têm duas opções: engolir a aliança com a direita em nome de manter a esquerda eleitoralmente unida, ou então, em nome da independência de classe do proletariado, organizar essa unidade entre aqueles que assim a desejam, e quem deseja a aliança com a direita, que a faça sem nós. A essência da tática da Resistência consiste, portanto, em atrasar e protelar essa definição, obscurecendo as divergências estratégicas no seio da classe proletária. Só que atrasar e protelar essa decisão para mais perto das eleições, num momento a agitação pragmática se intensifica e a histeria imprime um ritmo alucinante ao debate tático-estratégico, significa desde já decidir: a unidade com Lula para derrotar Bolsonaro é mais importante do que criar as condições (hoje inexistentes) para uma Frente de Esquerda sem a direita.

Isso não é apenas o resultado lógico e necessário da estratégia reformista à qual a Resistência vem se agarrando (“A luta por um governo de esquerda deve ser o centro da estratégia”, defendia Valério Arcary em seu artigo “Reformas estruturais e medidas anticapitalistas para um governo de esquerda” – artigo que, sintomaticamente, associa a vitória de um “governo de esquerda” diretamente a Lula e à via eleitoral. Fica o mistério: se Gabriel Casoni sabia que era impossível convencer Lula de um programa anticapitalista, de que modo Valério Arcary considera que a viabilidade de “medidas anticapitalistas” passa por um “debate sem ultimatos” entre os socialistas e Lula?). Isso é também a política prática que a Resistência vem promovendo. Um exemplo emblemático.

No último dia 23 [08/2021], Lula visitou, em Fortaleza, Eunício Oliveira, seu aliado de longa data. “É importante destacar nossa união e confluência de ideias em prol de um país mais justo e com mais oportunidades para os brasileiros”, frisou Eunício na ocasião.[2]

Haveria melhor exemplo da política burguesa conciliadora do que Eunício de Oliveira (MDB)? Empresário do ramo de transportes de valores, segurança privada e alimentos, possui um patrimônio declarado de R$89 milhões. Escalou, de 1998 a 2019, da posição de deputado federal para presidente do senado, passando pelo Ministério da Comunicação de Lula no meio do caminho, entre 2004 e 2005 (sendo derrubado em meio à ofensiva de Roberto Jefferson contra o governo). Como bom oportunista, declarou, sobre seu voto a favor do impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, que “sempre foi lulista, mas não petista”, e que: “Eu não participei de golpe, eu não participei de impeachment, fui voto vencido”.[3]

E para o lulismo, isso basta para redimir Eunício. A Resistência, por sua vez, nos disse, pelas palavras de Gabriel Casoni, que era preciso criticar a política de alianças regionais com o centrão, por exemplo, no Nordeste. Se toda a tática já não padecesse das contradições internas apontadas anteriormente, seria esse um ótimo momento para a Resistência denunciar a sabotagem de Lula a uma “Frente de Esquerda”. No entanto, não foi essa a opção da organização.

A escolha, ao contrário, foi promover uma ampla agitação divulgando a iniciativa de Nestor Bezerra, quadro da Resistência, que utilizou-se de sua posição sindical como dirigente dos operários da construção civil de Fortaleza para prestar uma homenagem a Lula! No dia 21, pouco antes da visita de Lula a Eunício, Nestor informou:
 
Em nome dos operários da construção civil de Fortaleza, presenteamos o ex-presidente com um capacete dos operários e destacamos o papel que ele pode cumprir na construção de uma frente de esquerda nas lutas e nas eleições para derrotar Bolsonaro. Uma frente das esquerdas e movimentos sociais, sem setores da direita e com um programa que reverta toda a agenda ultra-neoliberal começando pelo teto dos gastos, que garanta emprego com direitos e acabe com a fome.[4]

Poderíamos supor, então, que após esse gesto, quando Lula cuspisse na cara da solicitação por uma “frente das esquerdas sem setores da direita”, confabulando com Eunício, o companheiro da Resistência então protestaria, denunciado a recusa, correto? Mas, ao contrário disso, no próprio dia 23, depois de já noticiado o encontro entre Eunício e Lula, Nestor Bezerra voltou a divulgar seu gesto, como se nada tivesse acontecido:
 
Com Lula no Encontro dos Movimentos Sociais. Entregamos ao ex-presidente um capacete dos operários da construção civil de Fortaleza e reforçamos que os operários vêem nele a esperança de derrotar Bolsonaro. E para que isso de fato ocorra, é preciso que Lula chame desde agora, a luta nas ruas pelo Fora Bolsonaro, e busque unir as esquerdas com um programa anticapitalista. Uma frente de esquerda nas lutas e nas eleições, sem setores da direita, defendendo desfazer todas as reformas e ataques de Temer e Bolsonaro aos trabalhadores, é a saída para derrotarmos o neofascismo no Brasil.[5]

“É assim que se faz!”,[6] celebrou no Facebook o mesmo Gabriel Casoni que nos assegurou que “defender o nome de Lula, sem criticar sua política de alianças” significa “ceder ao pragmatismo petista e ao programa da conciliação de classes”.

É assim que a Resistência vem girando: de um “apoio crítico” ao petismo contra Bolsonaro a um “apoio cínico” disfarçado de “luta por uma frente de esquerda com Lula sem a direita”, na qual somem as críticas à conciliação lulista e sobra apenas a agitação e propaganda que difundem a ilusão em uma tática que o próprio Lula torna impossível!

Entendo perfeitamente que, nos momentos em que a luta defensiva salta para o primeiro plano, em que a classe trabalhadora é empurrada para o terreno da resistência, se difunde o pessimismo e o espírito de desistência da contra-ofensiva. Prolifera, nessa época, o liquidacionismo dentro das próprias organizações radicais. Se dissemina a renúncia a orientar a luta contra os reacionários burgueses sob a bandeira da revolução socialista, em nome de, “anti-sectariamente”, nivelar a oposição pela esquerda liberal majoritária. Sintomas do fatalismo dos fracos, como chamava Gramsci. O que é de se espantar, no entanto, são menos essas formas abertas do reboquismo, representadas pelo PCO, do que essas formas híbridas e transitórias, como as que Gabriel Casoni defende. A narrativa empunhada por Arcary em defesa de sua estratégia é, nesse sentido, mais consequente, porque admite abertamente a renúncia a estabelecer a “demarcação com PT e Lula”, porque, se o fizesse, essa demarcação “seria percebida por imensos setores das massas populares como um obstáculo para derrotar Bolsonaro.”[7] E, aqui, o nó se desata: é evidente que também a exigência de uma “frente de esquerda sem a direita” “seria percebida por imensos setores das massas populares como um obstáculo para derrotar Bolsonaro” e que, portanto, pouca alternativa restará, ao fim e ao cabo, do que declarar apoio a Lula, mesmo com a direita…

As mais influentes direções da classe trabalhadora defendem a unidade com a direita em torno de Lula (isso para nem mencionar os neo-ciristas da CSB e da Farsa Sindical, que já levaram a sua aliança com a burguesia ao patamar da organicidade partidária e econômica). A ideia de uma unidade da esquerda sem a direita pode até ser popular entre uma minoria de organizações socialistas e entre parcelas das bases petistas – mas mesmo aqui, como já vimos, essa ideia não figura como uma condição para o apoio à candidatura de Lula contra Bolsonaro. A questão que fica é: de que modo uma tática que abre mão da agitação de denúncia pode contribuir para elevar o nível ideológico e organizativo da classe trabalhadora? Como, se ela borra as fronteiras entre a política reformista e a política anticapitalistas, agitando a ilusão da viabilidade de uma política anticapitalista em aliança com Lula? Como, se ela teme dizer as verdades difíceis que ainda não são reconhecidas pela maioria? Unidade com Lula e o diabo contra Bolsonaro ou política anticapitalista independente do proletariado: eis as únicas alternativas colocadas para a classe trabalhadora, e faz melhor quem admite o próprio desespero e abraça a primeira, do que quem defende a primeira com fraseologia a favor da segunda. Tentando equilibrar-se entre ambas, a Resistência será irresistivelmente atraída para onde a gravidade é mais forte: em direção ao pragmatismo. O que sobra, então, é só uma autoproclamação de boas intenções revolucionárias, desamparada de uma luta ideológica revolucionária cotidiana e sistemática. Isso sim merece o nome de “revolucionarismo autoproclamatório”![8]

Não é raro confundirmos nossos desejos com a realidade. Entendo e compartilho com qualquer trabalhador(a) consciente o desejo pela construção da mais massiva e vigorosa unidade da classe proletária. Compreendo também que pareça óbvio, e mais fácil, começar a unidade “do maior para o menor”, e considerar indispensáveis as organizações e personalidades mais influentes entre os trabalhadores. Mas é dever de toda política revolucionária (se deseja manter-se revolucionária e ser consequente com as verdades elementares da experiência histórica do proletariado), paciente e prolongadamente, criar as condições efetivas para essa unidade avançada por meio de uma agitação e de uma propaganda que reconheça a inviabilidade desse caminho ilusório; apontar que a viabilidade histórica de uma unidade efetiva, independente e anticapitalista da classe trabalhadora passa, necessariamente, pela reorganização da classe proletária em torno de organizações classistas independentes e anticapitalistas, por meio de um Encontro Nacional da Classe Trabalhadora, organizado desde as bases – não pela simples conciliação entre as direções revolucionárias e as reformistas. Em nome da unidade de ação extraparlamentar do proletariado, devemos fazer quantos chamados à luta sejam necessários a todas as organizações dos trabalhadores, mesmo as reformistas. Mas isso não significa jogar para baixo do tapete as verdades difíceis, em nome da aparência de uma facilidade imediata. Muito menos significa subordinar a unidade de ação na luta de massas à unidade eleitoral.

Aqueles que chantageiam os comunistas, alegando que nos falta compromisso com o objetivo imediato de derrubar Bolsonaro, deviam antes de mais nada denunciar o próprio sr. Lula, cuja tática consiste exatamente em protelar a luta pela saída de Bolsonaro para 2022, em nome de assegurar sua vitória eleitoral! Lula acredita que conciliar em sua candidatura reformista a esquerda e os trabalhadores com a burguesia liberal é o único caminho para isolar e derrotar o bolsonarismo. Mas esse é justamente o caminho que incubou e seguirá fortalecendo a influência da extrema-direita entre as massas. Para lutar por uma estratégia anticapitalista e por uma tática de independência de classe, é fundamental denunciar as manobras oportunistas de Lula e intensificar a organização da luta de massas desde já, sem esperar pelas eleições. Às ruas em 7 de setembro!
 
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Notas:
[1] https://esquerdaonline.com.br/2021/08/21/lula-o-povo-trabalhador-e-o-psol/
[2] https://www.facebook.com/euniciooliveiraoficial/posts/4324751637607294
[3]https://www.opovo.com.br/noticias/politica/2018/10/eunicio-diz-que-sempre-foi-lulista-e-afirma-ter-sido-contra-o-impeachm.html
[4] https://www.facebook.com/NestorBezerraPsol/posts/1477891519211752
[5] https://www.facebook.com/NestorBezerraPsol/posts/1479032762430961
[6] https://www.facebook.com/gabriel.freitascasoni/posts/4580004605383938
[7]https://esquerdaonline.com.br/2021/08/20/o-que-esta-em-disputa-no-congresso-do-psol-tres-perguntas-simples/
[8] A peça em resposta ao artigo do camarada Jones Manoel é sintomática: revela a conexão entre o giro da Resistência e o balanço “autocrítico” que a corrente faz da sua experiência no PSTU. Sua principal preocupação tornou-se livrar-se do sectarismo do passado, o que é bastante compreensível em princípio. Mas, ao fim, essa preocupação os colocou em guarda contra sua própria sombra. Para evitar qualquer sectarismo, qualquer “autoproclamação”, consideram melhor adotar uma concepção difusa e leniente do que seja o revolucionarismo consequente, em oposição ao “autoproclamatório”. Parece que consideram como a fonte do sectarismo o próprio esforço da política proletária revolucionária em se demarcar da política reformista de conciliação de classes. Remover a agitação e a propaganda revolucionária do centro de suas preocupações, e colocar no seu lugar as operações eleitorais da social-democracia predominante no movimento dos trabalhadores, esse certamente é um modo de “curar-se” do “revolucionarismo autoproclamatório”. Mas, então, o que sobra de revolucionário nesta política, senão a autoproclamação, a declaração de intenções, o prestígio passado, em meio a uma prática presente social-democrática?
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terça-feira, 27 de abril de 2021

O trotskismo como movimento oportunista

 
por Kyrillos Papastavrou
Communist Epiteorisi-KKE/2008

1. Introdução
2. Formação do trotskismo como movimento oportunista
2.1. Período pré-revolucionário
2.2. Período pós-Outubro
3 O trotskismo como força contrarrevolucionária
3.1. Uma breve história do trotskismo na Grécia no período entre guerras
3.2. Trotskistas durante a ocupação alemã e a guerra civil
4. Trotskismo hoje
5. características comuns de grupos trotskistas
5.1. Referências a Trotsky
5.2. Propaganda antissocialista
5.3. Cooperação com a social-democracia
5.4. Apoiar várias formas de ajuste ao sistema capitalista
5.5. Atitude em relação à estrutura imperialista da UE
5.6. Ataques ao movimento comunista
6. Conclusão 

1. Introdução

Neste artigo, examinaremos o trotskismo, sua história como corrente oportunista dentro do movimento operário e seu estado atual.

A necessidade desta análise deve-se aos seguintes fatores:

Em primeiro lugar, o sistema capitalista usa ativamente a imagem de Trotsky, fazendo ataques a-históricos a Lenin e Stalin, e questionando a construção do socialismo na URSS. No 89º aniversário da Revolução de Outubro, a luta pelas declarações de Trotsky sobre a alegada impossibilidade da vitória do socialismo na Rússia está ganhando força.

Em segundo lugar, várias organizações, tanto em nosso país como no exterior, que se autodenominam trotskistas ou usam a teoria trotskista, estão aumentando seus esforços entre os jovens, especialmente em escolas e universidades, bem como entre a classe trabalhadora. Esses grupos são muito pequenos para serem uma ameaça no movimento comunista, mas sob o pretexto de “revolucionismo”, eles reproduzem visões burguesas e oportunistas, promovem forças inofensivas para o capitalismo e criam obstáculos para o Partido e o Komsomol no plano ideológico e luta política pelo socialismo.

Para estabelecer uma base para a compreensão do trotskismo, diremos de antemão que o trotskismo é uma corrente oportunista no movimento dos trabalhadores, caracterizada pela fraseologia ultrarrevolucionária pequeno-burguesa em palavras e compromisso absoluto na prática. Nos anos 1930, nas condições da luta imperialista contra a URSS, o trotskismo assumiu uma postura abertamente hostil à União Soviética. Como corrente ideológica e política, o trotskismo tornou-se hostil à teoria e prática do leninismo. 

2. Formação do trotskismo como um movimento oportunista 

2.1. Período pré-revolucionário

Trotsky e seus seguidores modernos muitas vezes se autodenominam bolcheviques e fazem referência aos bolcheviques. O bolchevismo, entretanto, “existe como uma corrente de pensamento político e como um partido desde 1903” (V.I. Lenin, Esquerdismo: doença infantil do comunismo), e o trotskismo tem sido hostil ao bolchevismo desde o início. O ponto de partida do trotskismo foi a rejeição da doutrina de Lenin de um novo tipo de partido. Já no Segundo Congresso do POSDR em 1903, Trotsky se aliou aos oponentes de Lenin nos debates sobre a Carta.

As posições revolucionárias de Lenin sobre a questão da Carta foram aceitas pela maioria, e a ala que o apoiou foi chamada de Bolcheviques, enquanto o grupo oportunista (Trotsky, Martov, Axelrod) permaneceram em minoria e, portanto, foram chamados de mencheviques.

É revelador como Trotsky se dirigiu a Lenin durante esse período de luta. Aqui estão alguns trechos do livro de Trotsky, Nossas tarefas políticas, publicado em 1904, que caracterizam suas visões e são evidências de sua linha de pensamento oportunista e antimarxista. Eles refutam as alegações dos trotskistas de que o desacordo de Lenin com Trotsky era parcial. Criticando o trabalho de Lenin “Um passo à frente, dois passos atrás”, Trotsky escreveu:

(…) E isso deveria ser pensamento marxista e social-democrata! Na verdade, nenhum cinismo maior pode ser demonstrado em relação à mais rica herança ideológica do proletariado do que o camarada Lênin! Para ele, o marxismo não é um método de análise científica, um método que impõe enormes responsabilidades teóricas; é um trapo que você pode pisar, se quiser; uma tela em branco na qual projetar coisas maiores que a vida e uma regra flexível quando o estado de consciência partidária deve ser levado em consideração!

Em outro lugar, ele menciona o seguinte:

O chefe da ala reacionária do nosso partido, o camarada Lênin (…) foi forçado a definir a social-democracia de uma forma que é um ataque teórico ao caráter de classe do nosso partido. Sim, um ataque teórico, não menos perigoso do que as ideias ‘críticas’ de alguns Bernstein (ibid., P.98)

Noutro local, com referência ao jornal Iskra:

O antigo Iskra assumiu como tarefa não iluminar a consciência política da intelectualidade, mas teoricamente aterrorizá-la. Para os social-democratas formados nesta escola, “ortodoxia” é algo muito próximo da verdade absoluta dos jacobinos. A verdade ortodoxa governava em todos os lugares, até mesmo na questão da cooptação. Quem quer que o desafiasse foi removido; quem questionou ficou em dúvida. (ibid., p.96)

Em 1910-1914, o POSDR não era um partido único; havia partidos separados que se concentravam em seus próprios ramos e tinham seus próprios órgãos de governo. Entre eles, os principais eram os bolcheviques de Lenin e dois grupos mencheviques, os trotskistas e os otzovistas. Os trotskistas reivindicaram o papel de conciliadores entre os bolcheviques e os mencheviques, mas em essência apoiaram as posições dos bandidos mencheviques.

Durante a Primeira Guerra Mundial, o trotskismo era parte integrante do “centrismo”, uma tendência na social-democracia internacional que oscilava entre o social-chauvinismo e o pacifismo pequeno-burguês e defendia a “reconciliação” entre os socialistas revolucionários (esquerdistas) e os oportunistas e revisionistas (direitistas).

No curso dos processos revolucionários na Rússia, os trotskistas declararam seu acordo com a linha bolchevique e no VI Congresso do POSDR (B) foram aceitos nas fileiras dos bolcheviques. Assim, Trotsky tornou-se membro do Partido Bolchevique em julho de 1917.

Mas mesmo depois de se juntar aos bolcheviques, Trotsky manteve sua autonomia e continuou sua luta contra Lenin. Os trotskistas se opuseram ao Tratado de Paz de Brest em 1918 e interromperam sua assinatura oportuna, causando uma grande perda para o ainda jovem e fraco poder soviético.

Durante a Guerra Civil, o trotskismo se tornou uma corrente oportunista dentro do PC Russo (B). Em 1920-1921, os trotskistas iniciaram uma discussão intrapartidária sobre sindicatos. Eles formaram facções com seu próprio programa político. A essência de seu programa era transformar os sindicatos em parte do mecanismo do Estado e questionar o papel dirigente do partido na construção do socialismo.

O princípio básico do trotskismo era a negação da possibilidade de construir o socialismo na URSS. Seguindo os passos dos líderes mencheviques, os trotskistas argumentaram que a classe trabalhadora na União Soviética não poderia consolidar seu poder e construir o socialismo por causa do atraso técnico e econômico do país, que estava em um ambiente capitalista. Portanto, eles argumentaram que a vitória da revolução seria muito curta e que o poder soviético seria derrotado a menos que as revoluções socialistas também fossem vencidas nos países europeus, o que ajudaria a classe trabalhadora da URSS. O trotskismo se opôs aos princípios de formação de um novo tipo de partido e, ostensivamente defendendo a democracia intrapartidária, reivindicou liberdade para criar facções dentro do partido.

Sob a influência de Trotsky, grupos trotskistas foram formados em outros partidos, como Alemanha, França, Grã-Bretanha, Tchecoslováquia, etc. Na URSS, todos os grupos antibolcheviques se uniram em torno do trotskismo. Lenin e Stalin responderam aos trotskistas com artigos, discursos e declarações nos órgãos do Partido. O trotskismo foi condenado em muitas conferências e plenárias do Comitê Central.

Em 1927, o 15º Congresso do PC Russo (B) aprovou a decisão do Comitê Central de expulsar Trotsky e Zinoviev do partido. Em 1928, o 9º Plenário do Comitê Executivo do Comintern enfatizou que uma filiação ao trotskismo era incompatível com a adesão à Internacional Comunista, e esta decisão foi ratificada pelo 6º Congresso (1928).

2.2. O período pós-Outubro

Tanto os trotskistas quanto a burguesia dão à luta no Partido e no estado soviético nas décadas de 1920 e 1930 o caráter de um confronto pessoal entre Trotsky e Stalin. A propaganda burguesa retrata Trotsky como um revolucionário puro e inocente, contra o qual foi cometida traição. Esta propaganda não é acidental, dado o quão qualitativa e profunda é: documentários e longas-metragens são feitos, é divulgado na mídia, em livros didáticos, etc.

E assim, os trotskistas têm outra maneira de promover seus pontos de vista que os torna conhecidos em um grau desproporcional às suas capacidades organizacionais. O sistema capitalista tem um interesse objetivo em promover o trotskismo porque essas visões cultivam e desenvolvem uma linha de derrotismo. Esta não foi uma luta de personalidades, mas uma luta de posições políticas em torno de questões de construção do socialismo, administração estatal, etc., uma luta em condições sem precedentes.

Trotsky e seus seguidores trataram o marxismo de forma dogmática, assim como muitos líderes oportunistas de direita da Segunda Internacional. Eles tinham um “modelo ideal” de revolução e construção socialista que estava muito distante das complexidades da Rússia em 1917. Os trotskistas, como intelectuais pequeno-burgueses, realmente acreditavam que as massas trabalhadoras não podiam liderar o campesinato pobre. Eles não acreditavam que sob a liderança do Partido Comunista, as massas iletradas e politicamente atrasadas poderiam implementar as ideias da Revolução de Outubro e construir uma sociedade socialista. Eles acreditavam que uma “ditadura no campo” deveria ser estabelecida para reduzir a resistência dos camponeses “hostis” aos trabalhadores e esperar a ajuda da revolução proletária do Ocidente. Eles também propuseram aventuras militares em nome da guerra revolucionária e da “exportação da revolução”.

No entanto, a onda revolucionária de 1918-1923 não poderia prevalecer em nenhum outro país europeu, exceto na Rússia. Claro, não se pode culpar os bolcheviques por não travar guerras revolucionárias e exportar a revolução em um momento em que a guerra civil em seu país não havia acabado, quando eles enfrentavam intervenções e conspirações imperialistas, quando lutavam pelo domínio do poder soviético em todo o país.

A lógica dos trotskistas levou a um beco sem saída. Tendo classificado o marxismo não como uma ciência, mas como um dogma, não conseguiam compreender a complexidade das tarefas que se colocavam ao poder soviético, país que começava com um baixo nível de desenvolvimento das forças produtivas e onde a grande maioria da população eram camponeses. Eles não podiam entender a evolução da estratégia da revolução com base na doutrina do imperialismo. Eles defenderam dogmaticamente as primeiras estimativas de Marx, Engels e outros marxistas antes do início do século XX sobre a vitória da revolução socialista nos países capitalistas desenvolvidos da Europa Ocidental.

Lênin contribuiu para o desenvolvimento do marxismo formulando a teoria do “elo fraco da cadeia do imperialismo”, com base na lei do desenvolvimento desigual do capitalismo.

Segundo essa teoria, o sistema mundial do imperialismo pode ser rompido em um país atendendo a uma série de condições (históricas, econômicas e políticas), tornando o capitalismo mais vulnerável ao início de uma revolução. Ele teorizou a possibilidade de uma revolução ser realizada e vencida em um único país:

(…) A palavra de ordem dos Estados Unidos do Mundo dificilmente seria correta, primeiro, porque se confunde com o socialismo; segundo, porque pode ser erroneamente interpretado como significando que a vitória do socialismo em um único país é impossível, e também pode criar concepções errôneas quanto às relações de tal país com os outros.

O desenvolvimento econômico e político desigual é uma lei absoluta do capitalismo. Consequentemente, a vitória do socialismo é possível primeiro em vários ou mesmo em um único país capitalista. Depois de expropriar os capitalistas e organizar sua própria produção socialista, o proletariado vitorioso daquele país se levantará contra o resto do mundo – o mundo capitalista – atraindo para sua causa as classes oprimidas de outros países, agitando levantes nesses países contra os capitalistas, e em caso de necessidade usar até mesmo a força armada contra as classes exploradoras e seus estados. (V.I. Lenin, “Sobre o slogan dos Estados Unidos da Europa”)

Ao mesmo tempo, Trotsky escreveu em resposta ao artigo de Lenin:

Seria inútil pensar… que a Rússia revolucionária, por exemplo, seria capaz de se manter diante da Europa conservadora, ou que a Alemanha socialista poderia permanecer isolada em um mundo capitalista.

Ver as perspectivas da revolução social dentro de uma estrutura nacional é sucumbir à mesma estreiteza nacional que forma o conteúdo do social-patriotismo. (L.D. Trotsky, “O programa da paz”)

Por outro lado, devemos também reconhecer o fato de que o país em que a cadeia imperialista se rompeu em 1917 não era qualquer país, mas o Império Russo, que havia reunido uma grande quantidade de terras com um subsolo rico, o capitalismo monopolista estava se desenvolvendo, profundas contradições dentro dela e a persistência de muitos elementos pré-capitalistas, principalmente na produção agrícola, mas também na superestrutura.

Numa época em que a revolução, com suas dificuldades inimagináveis ​​durante a Guerra Civil e a aguda luta de classes, lutava para fortalecer o poder soviético; enquanto Lenin e Stalin, como líderes do PC Russo (B) e toda a liderança bolchevique, usavam todas as oportunidades para ganhar o poder revolucionário para a classe trabalhadora e a transição para o socialismo na Rússia, Trotsky cultivava o derrotismo, retirando-se da questão de fortalecer a URSS.

A visão dos trotskistas de que a revolução era impossível na Rússia baseava-se na ideia de que teria sido impossível integrar os pobres e as classes médias à revolução, que teria sido impossível preservar a união de trabalhadores e camponeses, e que um choque entre a classe trabalhadora e as amplas massas camponesas era inevitável. A única saída, de sua perspectiva, era esperar a ajuda das revoluções proletárias no Ocidente. Este ponto de vista foi expresso por Trotsky a partir de 1905 com base nas disposições para a revolução contínua ou permanente formuladas por Marx e Engels em 1850, que previram a possibilidade de transformação da revolução democrático-burguesa em revolução socialista, e sua expansão a partir de país a país na Europa capitalista avançada.

Mas a revolução permanente, para Trotsky, significava um confronto com o campesinato, que era visto como uma força reacionária, independentemente da diferenciação de classe na aldeia. Lenin, comentando sobre a posição de Trotsky, escreveu:

Dos bolcheviques, a teoria original de Trotsky emprestou seu apelo por uma luta revolucionária proletária decisiva e pela conquista do poder político pelo proletariado, enquanto que dos mencheviques ela emprestou o” repúdio “ao papel do campesinato. (V. I. Lenin, “Nas duas linhas da revolução”)

Trotsky interpretou dogmaticamente o fato de que os camponeses, como pequenos proprietários de terras, apegados a suas terras e propriedades, não eram uma classe única, não podiam em si mesmos desempenhar um papel progressivo no desenvolvimento social com base em sua posição social e no quadro geral da agricultura na Rússia no momento. Em essência, era uma concepção mecânica da luta de classes, uma absolutização do lado reacionário do pequeno proprietário, a impossibilidade de arrastá-lo para a luta com a burguesia ao lado do proletariado, uma descrença nas habilidades do proletariado e sua festa.

Mas essa possibilidade foi prevista por K. Marx e F. Engels, como pode ser lido em O manifesto comunista, que afirma que os camponeses podem ajudar a revolução,

Se por acaso são revolucionários, só o são devido à sua iminente transferência para o proletariado; eles, portanto, não defendem seus interesses presentes, mas seus interesses futuros, eles abandonam seu próprio ponto de vista para se colocarem como o do proletariado. (K. Marx, F. Engels, O manifesto comunista)

Isso é visto ainda mais claramente no 18 brumário de Luís Bonaparte:

Portanto, os interesses dos camponeses não estão mais, como sob Napoleão, de acordo, mas agora estão em oposição aos interesses burgueses, ao capital. Assim, eles encontram seu aliado natural e líder no proletariado urbano, cuja tarefa é derrubar a ordem burguesa. (K. Marx, F. Engels, 18 brumário de Luís Bonaparte, Capítulo VII)

Os trotskistas não viam a necessidade de se comprometer com as massas camponesas, que constituíam a grande maioria da população russa, nem a possibilidade de integrar grande parte dos pobres e do campesinato médio no programa da revolução.

A diferenciação do campesinato intensificou a luta de classes dentro deles; despertou muitos elementos até agora politicamente adormecidos. Ela aproximou o proletariado rural do proletariado urbano… Esta é uma verdade tão óbvia que nem mesmo as milhares de frases em dezenas de artigos de Trotsky em Paris irão “refutá-la”. Trotsky está de fato ajudando os políticos trabalhistas liberais na Rússia, que por “repúdio” ao papel do campesinato entendem uma recusa em levantar os camponeses para a revolução!! (V. I. Lenin, “Sobre as duas linhas da revolução”)

O acordo com o campesinato, ou seja, a opção de um campesinato unido pela divisão das terras – que depois da Revolução de Outubro passou a ser propriedade do Estado – não significou o abandono da meta socialista de comunalização da grande produção e da ditadura do proletariado. No entanto, levou em consideração o equilíbrio das forças de classe na sociedade russa, reforçou as diferenças de classe dentro do próprio campesinato e aumentou a concentração da produção agrícola fragmentada de modo a facilitar o caminho de sua socialização:

O que significa paz no campo? É uma das condições fundamentais para a construção do socialismo. Não podemos construir o socialismo se tivermos atividades de bandidos e revoltas camponesas. A área de cultivo atingiu as dimensões anteriores à guerra (95 por cento), temos paz no campo, uma aliança com os camponeses médios, um campesinato pobre mais ou menos organizado, sovietes rurais fortalecidos e o prestígio aumentado dos proletariado e seu partido no campo.

Criamos, assim, as condições que nos permitem avançar na ofensiva contra os elementos capitalistas no campo e garantir mais sucesso na construção do socialismo em nosso país ”. (Stalin, “A oposição trotskista antes e agora”)

Após o fim da guerra civil, quando surgiu a tarefa de fortalecer a união dos trabalhadores e camponeses, Trotsky defendeu a coletivização violenta por meios militares, o que significaria essencialmente uma guerra civil no campo.

A coletivização ocorreu em 1929-1933 como resultado de uma feroz luta de classes, na qual foi possível atrair uma grande fração dos pobres por meio da coletivização. Sob essas condições, em 1930, Trotsky e seus seguidores descreveram a coletivização e a deskulakização como uma “aposta burocrática” (L. D. Trotsky, “Um rangido no aparato”). Em março do mesmo ano, Trotsky escreveu: “(…) a natureza utópica-reacionária da ‘coletivização total’ consiste... na criação forçada de grandes fazendas coletivas sem a base técnica que por si só poderia garantir sua superioridade sobre as pequenas” (L. D. Trotsky, “Carta aberta aos membros do VKP (B)”). Ele profetizou que “fazendas coletivas entrariam em colapso em antecipação à infraestrutura técnica” (Posfácio “do Editor” ao artigo de J. Gref, “A coletivização da aldeia e superpopulação relativa”, Boletim de Oposição No. 11, maio de 1930).

A realidade refutou todas essas “previsões”, apesar de todos os erros cometidos no desenvolvimento da construção socialista no caminho da coletivização.

Os trotskistas viam os sindicatos como os órgãos dirigentes da classe trabalhadora na construção do socialismo e queriam introduzir neles medidas militares. Na verdade, por trás desse conceito estava a noção de que a ditadura do poder do proletariado era exercida diretamente por toda a classe e, uma vez que a classe como um todo ainda não estava madura o suficiente, a “maturidade” seria imposta a ela por meio de medidas administrativas. Esse entendimento burocrático mais uma vez mostrou uma subestimação da possibilidade de convencer as massas por meio de atividades comunistas.

Lenin argumentou longamente com Trotsky sobre esse ponto. Em sua obra “Os sindicatos, a situação atual e os erros de Trotsky”, ele contrasta especificamente:

Mas a ditadura do proletariado não pode ser exercida por meio de uma organização que abranja toda essa classe, porque em todos os países capitalistas (e não só aqui, em um dos mais atrasados) o proletariado ainda está tão dividido, tão degradado e tão corrompido em partes (pelo imperialismo em alguns países) que uma organização que abrange todo o proletariado não pode exercer diretamente a ditadura do proletariado. Só pode ser exercido por uma vanguarda que absorveu a energia revolucionária da classe. (V. I. Lenin, “Os sindicatos, a situação atual e os erros de Trotsky”)

Sobre o papel a ser desempenhado pelos sindicatos no mesmo projeto, Lenin observou:

Não pode funcionar sem uma série de “correias de transmissão” que vão da vanguarda à massa da classe avançada e desta última à massa do povo trabalhador. (Ibid.)

Stalin também observou:

Os sindicatos podem ser denominados a organização abrangente da classe trabalhadora, que está no poder em nosso país. Eles são uma escola de comunismo. Eles promovem as melhores pessoas de seu meio para o trabalho de liderança em todos os ramos da administração. Eles formam o elo entre os elementos avançados e atrasados ​​nas fileiras da classe trabalhadora. Eles conectam as massas dos trabalhadores com a vanguarda da classe trabalhadora (…) (J. V. Stalin, “Sobre as questões do leninismo”)

Ele também explicou o papel do partido na ditadura do proletariado:

Claro, isso não deve ser entendido no sentido de que o Partido pode ou deve tomar o lugar dos sindicatos, dos Sovietes e das outras organizações de massa. O Partido exerce a ditadura do proletariado. No entanto, não o exerce diretamente, mas com a ajuda dos sindicatos e através dos Sovietes e suas ramificações. Sem essas “correias de transmissão”, seria impossível para a ditadura ser totalmente firme (…)

Mas isso, no entanto, não deve ser entendido no sentido de que um sinal de igualdade pode ser colocado entre a ditadura do proletariado e o papel dirigente do Partido (a ‘ditadura’ do Partido), que a primeira pode ser identificada com o último, que o último pode ser substituído pelo primeiro (…) (Ibid.)

Lênin destacou que a essência do desacordo reside precisamente na questão dos métodos de abordagem das massas, que Trotsky tratou mecanicamente, sem levar em conta não apenas as diferenças na maturidade das massas trabalhadoras, mas também a própria fraqueza do poder socialista em a primeira fase do seu domínio (um período transitório dentro do período transitório descrito por Lênin), quando era necessário não se identificar com os sindicatos, mas confiar neles. Trotsky e seus seguidores “simplificaram” os complexos processos de formação da consciência socialista das massas durante o período de construção socialista por decretos e medidas administrativas. Onde quer que eles dominassem a liderança dos sindicatos, eles entraram em conflito com as massas trabalhadoras.

Trotsky, apesar do fato de que os órgãos partidários relevantes votaram contra ele, continuou a apoiar essas opiniões durante a luta interna do partido na década de 1920.

Para resumir a apresentação crítica dos pontos de vista de Trotsky, eles podem ser caracterizados da seguinte forma: dogmatismo, negação da possibilidade de vitória do socialismo em um país, desconfiança das massas, confiar no autoritarismo e métodos militaristas e negação do papel do partido na ditadura do proletariado e uma visão pequeno-burguesa da liberdade de opinião e crença, que então levou à criação de facções e minou a unidade do PC Russo (B).

3. O trotskismo como força contrarrevolucionária

A negação persistente da possibilidade de construir o socialismo em um país levou a uma negação da natureza socialista da URSS. Trotsky acusou a liderança do PC Russo (B) de bonapartismo, afirmando a impossibilidade de construção socialista na Rússia e, com base nisso, passo a passo, deslizando para visões e ações cada vez mais reacionárias.

Na década de 1930, dada a agressão imperialista contra a União Soviética, o trotskismo essencialmente clamou pela derrubada do poder soviético. Para este fim, os trotskistas cooperaram com todos os grupos de oposição na URSS. As relações dos trotskistas com vários grupos antipartido e antissoviéticos da URSS estavam bem estabelecidas.

Trotsky defendeu abertamente a derrubada violenta do poder soviético, fazendo a pergunta: “É possível a remoção pacífica da burocracia?” e respondendo:

Depois das experiências dos últimos anos, seria infantil supor que a burocracia stalinista pudesse ser removida por meio de um partido ou congresso soviético. Na verdade, o último congresso do Partido Bolchevique aconteceu no início de 1923, o XII Congresso do Partido. Todos os congressos subsequentes foram desfiles burocráticos. Hoje, mesmo esses congressos foram descartados. Nenhuma forma “constitucional” normal permanece para remover a camarilha dominante. A burocracia pode ser obrigada a ceder o poder às mãos da vanguarda proletária apenas pela força. (L.D. Trotsky, “A natureza de classe do Estado Soviético”)

Ele considerou isso, é claro, uma tarefa nada fácil, reconhecendo que para o que ele chamou de “burocracia stalinista”, “as raízes sociais da burocracia residem, como sabemos, no proletariado: se não em seu apoio ativo, pelo menos em sua ‘tolerância’”. (Ibid.)

A vitória da contrarrevolução no final dos anos 1980 não é uma confirmação das teorias e previsões trotskistas. O socialismo não “entrou em colapso” e se transformou em capitalismo nos anos 20, como afirmavam os trotskistas. No processo de construção do socialismo, há uma luta entre o novo e o velho. Tanto Lenin quanto Stalin, como líderes da construção socialista, sabiam disso.

3.1. Uma breve história do trotskismo na Grécia no período entre guerras

A expressão mais proeminente do trotskismo na Grécia pode ser chamada de corrente “arquimarxista” dos anos 1930. Em meados da década de 1920, muito antes da formação do trotskismo, surgiu a revista Archive Marxism, cujo slogan era “Primeiro a educação, depois a ação”. O “marxismo de arquivo” foi uma corrente oportunista no movimento trabalhista grego. Os “arquimarxistas” se opuseram ativamente ao PC Grego. Um trecho de um anúncio do Politburo do Partido no Primeiro Congresso da Juventude Operária é típico: “Membros do ‘Arquivo’, delegados e participantes comuns, vendo seu fracasso e buscando a dissolução da conferência, atacaram membros e simpatizantes do Komsomol com facas, bem como representantes dos ‘separados’ do ‘Arquivo’.”

Em 1930, foi formado o Grupo Comunista de Arquivistas Marxistas-Leninistas, que em 1934 passou a se chamar Partido Comunista Arquivista Grego. Os “arquimarxistas” foram reconhecidos como os representantes oficiais da chamada Oposição de Esquerda Internacional na Grécia, que mais tarde evoluiu para a IV Internacional, e as principais organizações trotskistas que faziam parte da IV Internacional começaram aqui. Na virada dos anos 20 e 30, os “arquivistas” conseguiram influenciar alguns estratos da classe trabalhadora por causa da crise interna do partido no PC Chinês. No entanto, medidas ativas para superar a crise com base nas instruções do Comintern e o estabelecimento de laços fortes com as massas, levaram ao crescimento do PG Grego e limitaram a influência dos “arquimarxistas”.

Essa corrente dividiu-se em dois grupos: um grupo, liderado por Dimitris Giotopoulos, se separou em 1934 e o outro grupo liderado por D. Vitsori seguiu a IV Internacional. A prova da degeneração do Partido Arquimarxista Grego de Giotopoulos é a carta de boas-vindas ao governo enviada pela Conferência do Terceiro Partido em 1949 em homenagem à vitória sobre o DSE (o Exército Democrático Grego, o braço armado do PC Grego que participou na Guerra Civil). Após a dissolução do “partido arquimarxista” nos anos 1950, a maioria de seus membros aderiu a partidos burgueses.

Na direção trotskista na Grécia ao longo dos anos 30 e 40 houve constantes divisões e renomeações. O fim da guerra levou ao surgimento de uma série de pequenas organizações que afirmam ser a “seção grega da IV Internacional”.

3.2. Trotskistas durante a ocupação alemã e a guerra civil

Durante a ocupação, vários trotskistas se posicionaram a favor da resistência nacional e se juntaram à Frente de Libertação Nacional (EAM) ou colaboraram com ela. A maioria dos grupos trotskistas se opôs à resistência, entretanto, considerando-a uma continuação da guerra imperialista. Essa atitude também foi determinada por sua posição em relação à URSS e a questão de defendê-la. Para a maioria dos trotskistas gregos e os representantes oficiais da “IV Internacional” na Grécia, não se tratava de defender a União Soviética. Eles acreditavam que a conclusão de acordos entre a URSS e os estados imperialistas “desencoraja e decepciona o proletariado mundial e se torna um obstáculo para a transformação da guerra atual em uma guerra civil”, “A derrota da URSS inflamará as massas, mostrará a verdade, e seu instinto os levará a defender os ganhos da Revolução de Outubro.”

Com base nessas noções, os trotskistas – que dogmaticamente reproduziram os slogans de solidariedade dos soldados das coalizões imperialistas na Primeira Guerra Mundial – incitaram o povo grego a não resistir aos ocupantes alemães e italianos porque eram trabalhadores armados com os quais deveriam buscar a reconciliação para transformar a guerra numa revolução socialista.

Essas posições levaram a avaliações semelhantes às contidas na declaração conjunta dos dois principais grupos trotskistas durante a ocupação, o Partido Comunista Internacionalista da Grécia e o Partido dos Internacionalistas Comunistas da Grécia:

Os executados em maio de 1944 são vítimas da política do partido stalinista em nosso país, que em vista da guerra partidária, sabotagem, assassinatos de trabalhadores e camponeses alemães e atos de terrorismo pontual dá aos militares alemães o pretexto necessário para decapitar trabalhadores.

Por insistência da IV Internacional, uma conferência foi realizada em 1946 para unir os vários grupos trotskistas. Aqui estão os seguintes trechos característicos da Edição Especial da Frente Trabalhista de 15 de janeiro de 1946, o órgão do Comitê Central do Partido Revolucionário Internacional, que publicou as “propostas do Comitê Central” para uma “conferência unificadora” dos trotskistas da Grécia:

Em condições de guerra não há diferença entre a social-democracia, o stalinismo, os partidos democrático-burgueses e o fascismo.

(…) A tarefa do partido proletário (ou seja, os trotskistas – nota do autor) sob ocupação é intensificar sua luta contra as organizações nacionalistas e proteger a classe trabalhadora do ódio anti-alemão e do veneno nacionalista.

Nem é preciso dizer que eles caracterizam a EAM, a ELAS e outras organizações como nacionalistas.

E mais:

O Partido Proletário condena todas as lutas patrióticas, por mais em grande escala e quaisquer que sejam as formas que possam assumir, e exorta abertamente os trabalhadores a se absterem delas. (…) A participação no ‘movimento de resistência’ sob qualquer pretexto e com quaisquer documentos de apoio significa participação na guerra. O desligamento das massas da influência das organizações nacionalistas e a luta pela revolução socialista só é possível fora dessas organizações e com uma luta feroz contra elas e contra suas políticas nacionalistas. (…)

Todas as ações do EAM na Grécia foram profundamente reacionárias. (…) Ao matar alemães, eles (o EAM) deram origem a medidas brutais por parte das autoridades de ocupação contra a população. […] ELAS… era reacionário em sua estrutura interna. (…) A “Revolta de Dezembro”, Dekemvriana, o confronto armado entre os ocupantes britânicos e os monarquistas gregos de um lado e a ELAS do outro. – (Decembris) começou por causa da burocracia stalinista, elementos pretorianos militares e comandantes rebeldes, que estavam interessados ​​em … na vingança pelos inúmeros crimes que haviam cometido em todo o país. (…] ELAS não só interveio para prevenir um desenvolvimento mais amplo e mais rápido do movimento de massa, mas também suprimiu o movimento de massa. (…) Os trabalhadores nunca enfrentaram um terrorismo mais bárbaro do que o imposto pelo EAM. (…) Quem detém as massas, quem não permite que desenvolvam toda a sua atividade e toda a sua militância livre, é o Partido Estalinista. Precisamos quebrar esse freio. ”

(…) Nossos principais slogans políticos em nossa luta diária: Paz sem anexações e reparações. Retirada das tropas de ocupação da Alemanha, Itália, etc. (…) Nosso Partido não luta contra os britânicos nem pela sua remoção. (…) ‘Democracia Popular’… é o último meio usado pela burguesia para impedir a tomada do poder pelas massas. (…) O partido stalinista usa, como dezembro e a experiência espanhola mostraram, métodos puramente fascistas contra as massas revolucionárias. (…) O partido proletário (ou seja, os trotskistas – nota do autor) deve, ao mesmo tempo, organizar grupos de autodefesa contra gângsteres stalinistas. (…) O PC Grego não ameaça o estatuto da propriedade privada, pelo contrário, defende-o e é, portanto, formal e essencialmente o partido da burguesia grega.

Os trotskistas empregaram as seguintes táticas: usando o slogan da revolução socialista e mostrando as táticas do PC Grego como “ambíguas”, eles essencialmente apoiaram o imperialismo alemão-italiano e depois anglo-americano e sua intervenção na Grécia. Eles apoiaram a ofensiva da burguesia contra o EAM e depois a DCE. Nem uma palavra foi dita sobre o exército burguês e o terrorismo da classe dominante. Combater a EAM, ELAS e o PC Grego foi a principal tarefa dos trotskistas durante e após a ocupação.

Essa atitude explica as razões da falência política do trotskismo na Grécia e sua prolongada crise tanto durante a ocupação quanto depois da guerra, que acabou levando ao desaparecimento de sua influência. O trotskismo na Grécia enfrentou uma das crises ideológicas e políticas mais graves de sua existência no país. Portanto, não é surpreendente que os trotskistas sejam vistos como traidores pelo movimento popular armado durante a ocupação e a guerra civil.

Recentemente, várias publicações surgiram com o objetivo de glorificar os trotskistas como vítimas do “stalinismo” na Grécia. Esses esforços fazem parte de uma campanha anticomunista geral de revisão da história, que busca transformar um criminoso em vítima e vice-versa, para justificar até as ações de nazistas e colaboradores. O período de ocupação e guerra civil é um período crítico para a classe dominante de nosso país; foi o único momento na história do século 20 em que correram o risco de perder o poder, quando o solo tremeu sob seus pés.

O “pluralismo histórico”, que surgiu como resultado de eventos contrarrevolucionários na Europa no final do século 20, é na verdade uma calúnia e distorção anticomunista. A natureza anticomunista e o papel do trotskismo tornaram-no útil para a classe dominante de nosso país, e por isso é elogiado.

É ridículo assistir ao PC Grego ser acusado de “trair a revolução” em vários jornais de grupos trotskistas, quando na realidade eram os trotskistas que eram contra o povo.

4. Trotskismo hoje

O trotskismo tem sido um movimento divisionista, apesar das constantes tentativas de formar caricaturas da Internacional (“a 4ª Internacional”, etc.). Hoje existem vários grupos que se caracterizam como trotskistas, bem como grupos que concordam com suas posições teóricas e se movem em torno da “tradição comum” da qual o trotskismo faz parte. O ponto de partida para novas cisões nos grupos trotskistas “tradicionais” e a formação do chamado “neo-trotskismo” foi a década de 1950, quando Tony Cliff formulou sua teoria do “capitalismo de Estado” (referindo-se à natureza da estrutura do Estado da URSS), enquanto Trotsky caracterizou a União Soviética como um “estado operário deformado”. No cerne do “neo-trotskismo” está a “Tendência Socialista Internacional”, criada em 1977. Existem também grupos trotskistas semelhantes em nível internacional, que incluem quase todos os grupos que atuam como trotskistas no nível de um único país.

A história dos trotskistas na França nas décadas de 1950-70 e hoje é ilustrativa. Vários grupos trotskistas têm laços estreitos com a social-democracia e são o “berço de quadros”, como Lionel Jospin. Eles eram tão amplamente anticomunistas que o Le Monde os descreveu como uma “corrente anticomunista de esquerda”.

Hoje em dia os trotskistas, aproveitando o renascimento oportunista do PCF, estão reivindicando um papel maior, obtendo um número considerável de votos em várias eleições. Eles criticam o PCF, enquanto zelam pelas boas relações com os elementos de direita nele e no WCT, declarando seu compromisso com o sistema burguês e suas intenções de participar de coalizões de centro-esquerda. É indicativo que um dos seus principais grupos, a “Liga dos Comunistas-Revolucionários”, em colaboração com o segundo grupo principal, a “Luta dos Trabalhadores”, retirou do seu programa o objetivo de “conquistar a ditadura do proletariado”, caracterizando-o como “Estalinista”.

Existem vários grupos trotskistas marginais na Grécia: “Partido Revolucionário dos Trabalhadores”, “Organização dos Internacionalistas Comunistas da Grécia”, “União Comunista – Poder dos Trabalhadores”, “Start”, etc. O Partido Socialista dos Trabalhadores (anteriormente Socialista Organização Revolucionária) é mais forte. A sua atividade manifesta-se principalmente através da distribuição do seu jornal. Muitos de seus ativistas aparecem na imprensa burguesa. De acordo com suas posições e atributos político-ideológicos, podem ser classificados como neo-trotskistas.

O Partido Socialista dos Trabalhadores é a seção grega da Tendência Socialista Internacional. É provavelmente o maior da Europa, depois do Partido Socialista dos Trabalhadores Britânico (PSTB). Foi formado por um grupo de estudantes que acabou em Londres em 1967, após o estabelecimento do regime dos Coronéis Negros. Eles foram inicialmente influenciados pelo Maoísmo e formaram uma organização política chamada “Organização Socialista Revolucionária”. Durante sua estada em Londres, a organização entrou em contato com os Socialistas Internacionais de Tony Cliff. Após isso, caíram sob a influência do trotskismo. Quando os ativistas da Organização retornaram à Grécia, seu contato com os Socialistas Internacionais havia sido perdido, mas foi retomado no início dos anos 1980. Na época, este último já havia se renomeado como “Partido dos Trabalhadores Socialistas”. No final da década de 1990, seguiu-se a mudança do nome da organização para “Partido Socialista dos Trabalhadores”. Nos anos 1970 publicaram uma revista chamada “The Nodding Woman”, posteriormente e até hoje o PSA publica o jornal “Workers Solidarity” e a revista “Socialism from Below”. O SRS esteve em ascensão de 1989 a 1993 (ou seja, durante os golpes e a vitória da contrarrevolução nos países do socialismo – nota do autor), desde então caiu em uma longa crise e em um estado semimorto (que não pode ser observado sem considerar a reorganização das forças de classe em nosso país). Em 2001, houve uma cisão no PSA. Uma parte formou a “Esquerda Operária Internacionalista” (IWL), que está ideológica e politicamente ligada à seção americana da tendência, e que também se dividiu. A IWL participou da formação da Coalizão da Esquerda Radical (SYRIZA) e da coalizão do partido SIN (Coalizão das Forças de Esquerda).

A presença do PSA no nosso país é em grande medida determinada pela transferência para a Grécia, sem alterar as posições e atividades do PSA inglês. Basta olhar para o site do PSA, e o empréstimo não só dos princípios ideológicos básicos, mas também dos slogans e da forma, e isso se torna evidente de imediato. Sua principal atividade era distribuir um jornal e organizar discussões semanais. Em essência, é uma organização sem programa político – pelo menos publicado – que reduz o “trabalho socialista” ao ativismo.

Não há estratégia, apenas propaganda geral e abstrata da revolução e do socialismo. Nas organizações de massa (por exemplo, sindicatos, clubes, etc.) nas quais eles têm alguma influência, eles apoiam qualquer atividade e participam das atividades adotadas por algum “Fórum Social” ou “Tendência Socialista Internacional”. Não desenvolvem demandas e metas específicas para a luta, focalizando apenas as formas de luta. Ou seja, não são as reivindicações de greves, manifestações ou apreensões de edifícios que lhes interessam, mas sim as próprias ações a que atribuem um “caráter revolucionário”, independentemente da sua orientação política.

5. Características comuns de grupos Trotskistas

Os principais grupos trotskistas na Grécia e internacionalmente, apesar das diferenças privadas, têm as seguintes características comuns:

5.1. Referências a Trotsky

Os trotskistas defendem o caminho político de Trotsky. Eles expressam várias posições trotskistas de forma eclética, não como um sistema de pensamento político (o que não é). Eles se referem seletivamente a Lênin e suas obras, a fim de mostrar que Trotsky foi um continuador da obra de Lênin. Eles contrastam Lênin e Stálin. Eles reproduzem todos os argumentos anti-stalinistas.

5.2. Propaganda antissocialista

Eles negam as conquistas do socialismo no século 20 na União Soviética e nos países da Europa Central e Oriental. Eles consideram sua queda como um progresso social e apoiam todas as ações contrarrevolucionárias para restaurar o capitalismo que se desenvolveram nos antigos países socialistas, chamando-as de “revoluções populares”.

Por exemplo, o Partido Socialista dos Trabalhadores da Grécia e a literatura política do MST, a organização internacional a que pertence, acolhem os golpes anticomunistas e os chamam de “movimentos populares” e “levantes populares”. É assim que eles descrevem até mesmo as ações em que a CIA e ex-funcionários de estados capitalistas confessaram participação direta e indireta.

Eles reproduzem toda a propaganda anticomunista e antissoviética. Assim, a 593ª edição do jornal Rabochaya Solidarnost do SRP relatou:

A Rússia de Stalin era, no papel, um fascismo irreconciliável. “A URSS”, escreve Hobsbawm, “era popular principalmente por causa de sua oposição consistente à Alemanha nazista, que a apresentava como tão diferente do Ocidente vacilante … No entanto, em agosto de 1939, a Rússia‘irreconciliável ’concluiu um acordo secreto com a Alemanha. O infame Pacto Molotov-Ribbentrop ‘deu’ à União Soviética os Estados Bálticos e ‘dividiu’ a Polônia entre os dois países. Em setembro de 1939, quando as tropas alemãs entraram na Polônia Ocidental, o “Exército Vermelho” de Stalin entrou na Polônia Oriental. Em um mês, a Polônia deixou de existir. Foi necessário o plano de ‘Barbarossa’, um ataque alemão repentino à Rússia em junho de 1941, para que Stalin se posicionasse ao lado dos ‘aliados’.

Com a ajuda de tal calúnia, eles tentam anular o papel decisivo da URSS na luta contra o fascismo, bem como a contribuição do movimento comunista para a vitória dos povos sobre o imperialismo do Eixo, justificando assim o papel dos estados capitalistas no fortalecimento do fascismo na Europa.

Eles aderem à propaganda imperialista de que os países socialistas da Europa Oriental surgiram apenas como resultado do avanço das tropas soviéticas. Assim, eles dizem:

Nos países da Europa Oriental, como na ‘República Democrática Alemã’… não houve revolução dos trabalhadores em lugar nenhum … Eles foram assumidos pelas tropas de Stalin avançando sobre Berlim em 1944-45. Em seguida, o novo mapa da Europa foi oficialmente reconhecido durante a cínica divisão das esferas de influência pelos “Aliados” nas conferências de Yalta e Potsdam. Ninguém perguntou aos trabalhadores da Polônia se eles queriam estar na ‘esfera de influência’ russa, assim como ninguém perguntou aos trabalhadores da Grécia se eles queriam ‘protetores’ britânicos e americanos.

Aqui, eles igualam duas manifestações diametralmente opostas de solidariedade internacional de classe. De um lado, a solidariedade do capital internacional com a invasão anglo-americana de nosso país, de outro, a ajuda da URSS e do Exército Vermelho na construção do socialismo na Europa Central e Oriental, e os efeitos positivos disso teve sobre os trabalhadores desses países e do resto do mundo.

Como consequência de seu conceito de “capitalismo de estado” na URSS e nos países da Europa Central e Oriental, eles consideram o confronto entre o socialismo e o capitalismo de 1945 a 1989 como um conflito intra-imperialista:

O Pacto de Varsóvia não era ‘uma força oposta ao imperialismo americano’, como afirmavam os stalinistas de esquerda da época, mas era um campo imperialista rival que suprimiu e roubou ‘seu’ povo assim como a OTAN suprimiu e roubou ‘seu’ povo.

Essas visões reforçam a ideologia burguesa e a propaganda sobre o suposto fracasso na construção do socialismo.

5.3. Cooperação com a social-democracia

Existem abundantes evidências históricas, especialmente na Grécia e na Europa, de uma conexão explícita e implícita entre os trotskistas e a social-democracia como resultado das táticas de “entrismo” que usaram. As atividades trotskistas contribuíram tanto para a formação do necessário perfil “esquerdista” dos partidos social-democratas, quanto para a orientação anticomunista “esquerdista” desses partidos. Hoje, o trotskismo interage com os partidos social-democratas de várias maneiras. Muitos partidos social-democratas tiveram (e ainda têm) tendências trotskistas dentro de seus partidos, por exemplo, na Grécia, o grupo trotskista “Start” publicou seu jornal com o título “Start – Tendência Marxistas PASOK”.

Ao longo dos anos, eles apoiaram partidos social-democratas como o PASOK na Grécia, o Partido Trabalhista na Grã-Bretanha, especialmente durante os períodos em que o movimento trabalhista tinha grandes ilusões sobre a natureza e o papel dos social-democratas. Os trotskistas embelezaram e estão embelezando sua colaboração com frases revolucionárias, exortando o povo a votar no PASOK, ao mesmo tempo que falam sobre a revolução e o socialismo, apresentando “teorias” de que os revolucionários não dão a mínima para eleições.

Hoje, a posição declarada dos social-democratas – como um partido político burguês – força os trotskistas a se distanciarem deles e a mudarem de tática.

Apesar disso, são aliados “naturais” dos dirigentes sindicais social-democratas conformistas, apoiando suas táticas contra a classe trabalhadora. Os SRS e o resto dos grupos trotskistas participam de comícios e eventos organizados pelos líderes conformistas da GCEE (Confederação Total de Trabalhadores da Grécia) e ADEDI (Confederação Total de Trabalhadores do Setor Público da Grécia) em nome da “unidade” da classe trabalhadora e do “trabalho com as massas”.

Essas forças lutam contra as táticas do PC Grego no movimento sindical, e contra o apoio que dá aos sindicatos na PAME (Frente Militante de Todos os Trabalhadores), reproduzindo as acusações de sectarismo, isolacionismo e divisionismo no PC Grego. A escolha de entrar em confronto com “PΑΜΕ” objetivamente joga a favor da atividade sindical pró-governo “Kompanion”.

Considere, por exemplo, como eles comentaram sobre o desempenho dos sindicatos Kompanion na greve de 11 de maio de 2005: “Um número impressionante de manifestantes se reuniu no Champ de Mars”, comentando sobre a posição da liderança conciliatória GCEE-ADEDI: “Embora os líderes do GCEE e ADEDI hesitaram e não concordaram com uma solução mútua para o desafio do governo, as pessoas sentiram o desafio e deram a mensagem de que não se submeteriam ou deporiam as armas”.

Os dirigentes do GCEE-ADEDI não são “covardes” ou “hesitantes”: apoiam conscientemente a política da reforma capitalista, a estratégia do capital. Seu papel é manobrar, castrar e reconciliar os sentimentos dos trabalhadores, ao mesmo tempo que cimenta sua lealdade às políticas dos social-democratas.

Nesse sentido, os trotskistas e os atuais oportunistas de direita da Coalizão de Movimentos de Esquerda e Ambientalistas (CIN) prestam um grande serviço ao reproduzir ilusões sobre um “PASOK militante e esquerdista”, apresentando os dirigentes do GCEE e ADEDI como defensores da unidade da classe trabalhadora, ao ocultar seu papel subversivo no movimento sindical.  

5.4. Apoio a várias formas de ajuste ao sistema capitalista

Os grupos trotskistas são os principais apoiadores dos “Fóruns Sociais”. Eles acreditam que através de tais estruturas se forma o sujeito da “revolução mundial” e sua coordenação. Várias tendências trotskistas reivindicam um papel de liderança nessas estruturas, considerando-as como uma prova de sua posição sobre a prioridade da luta no nível internacional e a diminuição do papel da luta no nível nacional. As teorias sobre “novos movimentos” em oposição aos “desatualizados” associados ao movimento comunista, e o anticomunismo feroz dessas estruturas na forma de anti-stalinismo, criam condições favoráveis ​​para as atividades dos trotskistas. Eles afirmam ser a ala de “esquerda” e “revolucionária” em tais estruturas de ajustamento ao sistema capitalista, dominado pela social-democracia e representantes da regulação do capitalismo. Com fraseologia “revolucionária”, eles neutralizam o descontentamento popular, principalmente entre os setores inexperientes da classe trabalhadora, a juventude e a pequena burguesia e os incluem nas estruturas de acomodação.

Eles seguem a linha tradicional de oportunistas e social-democratas, a política de compromisso e cooperação dentro do “movimento anti-guerra” com um dos centros imperialistas na luta contra o outro (por exemplo, contra a dominação dos EUA dentro da chamada “globalização”). O seu papel foi reforçado durante o terceiro “European Social Forum” realizado em Londres, sob a égide da London City Hall, patrocinado pelo jornal Guardian e com a responsabilidade de organizar a empresa anônima “European Social Forum – London 2005 COO”; eles também reivindicaram esse papel no quarto EUF em Atenas.

Existem tentativas sistêmicas de criar estruturas nas quais forças comunistas (ou derivadas do comunismo) coexistam com trotskistas e social-democratas, sob a proteção do oportunismo. Os trotskistas têm uma atitude positiva em relação à formação do “Partido da Esquerda Europeia”, além disso, os trotskistas na Grã-Bretanha são membros da coalizão eleitoral “Respeito” do ex-deputado trabalhista Galahuei, que se candidatou a aderir ao Partido da Esquerda Europeia. A seguinte avaliação é característica: “O primeiro Congresso do PEL terminou no domingo, 30 de outubro. Foi um evento impressionante em termos de número de participantes. Representantes do partido e convidados de quase todos os partidos de esquerda na Europa participaram do congresso. Em toda parte, havia a sensação de que, depois que franceses e holandeses disseram não à Constituição Europeia e depois dos resultados das eleições na Alemanha, algo novo nasceu”.

5.5. Atitude em relação à estrutura imperialista da UE

Uma característica de todos os grupos trotskistas é a quase completa ausência da identificação da União Europeia como imperialista. Este tema é apresentado em seus documentos de forma muito limitada. Além disso, no passado, eles atacaram ativamente o CHRG por sua posição contra a UE, acreditando que essa posição era nacionalista, expressando os interesses da burguesia grega em busca de um lugar mais favorável no sistema do imperialismo internacional.

A questão da luta contra a UE não se levanta em lado nenhum, porque tal objetivo está relacionado com a análise leninista – e não trotskista – do imperialismo, com a teoria leninista do desenvolvimento desigual, com a teoria do “elo fraco” do imperialismo, e a possibilidade de iniciar e realizar uma revolução em um país. Por outro lado, a criação da União Europeia é vista por várias correntes trotskistas como um campo de luta de classes, e este fato defende sua posição de transição da luta de classes do nível nacional para o regional, e sua teoria de mundo. revolução.

No entanto, o próprio Trotsky foi um dos principais fundadores do slogan “Estados Unidos da Europa”, influenciado pelo “ultra-imperialismo” de Kautsky. Lênin rejeitou este slogan em “Sobre o Slogan ‘Estados Unidos da Europa’”, afirmando claramente que a adoção de tal slogan significaria rejeitar a lei do desenvolvimento desigual e a possibilidade do socialismo ter sucesso em um país.

Ao mesmo tempo, o seu apoio e participação ativa e enérgica nos Fóruns Sociais Europeus e o apoio ao slogan “Outra Europa é possível” classifica-os como apologistas do imperialismo europeu. Faz deles parte do moderno social-chauvinismo europeu, que se expressa por meio de uma tentativa de apoiar o centro imperialista europeu como adversário dos EUA.

5.6. Ataques ao movimento comunista

Todos os grupos trotskistas contemporâneos, atuando sistematicamente como uma força anticomunista – o que é historicamente característico da corrente trotskista – se autodenominam marxistas e se referem aos clássicos do marxismo, utilizando os termos “revolução” e “socialismo”. Seu anticomunismo na Grécia é acompanhado por “ataques amigáveis” ao Partido Comunista, principalmente a seus membros e ativistas. Os ataques amigáveis ​​consistem em glorificar membros comuns e apoiadores do partido como lutadores e, ao mesmo tempo, como elementos politicamente incultos que seguem as políticas do “reformista” CHRG. Na tentativa de confundi-los, não hesitam em lisonjear os membros do PC Grego e JCG (Juventude Comunista da Grécia) por escolherem participar da luta organizada, chamando-os de “camaradas” etc. Seu ecletismo ideológico serve à mesma tática. Eles citam os clássicos do marxismo, tirados do contexto, seja para sustentar suas teses ou para atacar o PC Grego. Os principais elementos de sua crítica contra o PC Grego e à JCG são os seguintes:

A tentativa de provar que toda a trajetória histórica do partido é uma trajetória de traição por parte da direção do partido em sua base, as massas que o seguem.

Começando com a EAM, a Revolta de dezembro, o DSE, os eventos de julho e o levante da Universidade Politécnica até os dias atuais, reproduzem o padrão de confronto entre as bases e as direções do partido. Eles citam a “linha stalinista-reformista” como a razão da “posição traiçoeira” do PC Grego. Em geral, eles acreditam que a linha do movimento comunista dos anos 20 e 30 é responsável pela derrota das revoluções na Europa, pela ascensão do fascismo, etc.

Eles distorcem deliberadamente a política do PC Grego. Eles repetem a linha do argumento do PASOK de que o PC Grego colaborou com a Nova Democracia (ND). Não são as questões individuais, mas a essência da política do partido que estão em sua mira: sua atitude para com os Fóruns, para o oportunismo, sua tática contra as direções sindicais conformistas, sua posição sobre a experiência do socialismo no século XX, etc. Assim, atribuem ao PC Grego que “a sua posição nas grandes lutas é negativa”, que a direção do Partido e do Komsomol “trata de forma sectária e conservadora os movimentos que inspiram milhares de jovens e se esforçam por construir um mundo melhor”.

A posição sobre a necessidade de “unidade de esquerda” é um dos principais “ataques amigáveis” dos trotskistas (especialmente do IRL, que pertence ao SYRIZA) e do SRS em relação ao PC Grego e ao JCG. Como já foi dito, os trotskistas sempre buscaram desempenhar o papel de “elo” entre a corrente revolucionária e o oportunismo, embora não o reconheçam em seus textos. Portanto, o SRS critica o IND pelo temor e derrotismo, mas não pela política do próprio IND:

Uma nova esquerda é possível e pode expressar essa dinâmica e se tornar uma dor de cabeça para Karamanlis, bem como para a oposição desidratada de Papandreos. Ela só precisa deixar para trás seu sectarismo, que por tantos anos foi a marca registrada da liderança do PC Grego. Na verdade, mesmo agora, o Rizospastis (o órgão central do Partido Comunista – nota P.S) não faz nada além de atacar a esquerda alemã. Basta que a liderança do SIN se separe de seu derrotismo. Mesmo no fim de semana, durante as eleições alemãs, Alekos Alavanos exortou os jovens a não seguirem os apelos para ‘vir e mudar o mundo’, mas ‘nos encontrarmos para ver se podemos mudar algo neste mundo (…) Claro, eles apoiam não apenas uma aliança de “organizações de esquerda”, mas também uma aliança com a chamada “Social-democracia de esquerda”, que é representada na Grécia por Polizogopoulos e pelos sindicalistas Kompanei. No final, eles argumentam que “para os partidários do PASOK e de toda a esquerda, ainda há esperança de que haja pessoas que estão lutando e que essa luta possa ter expressão política (…) Não se trata de encontrar quem vai se tornar a ala esquerda do PASOK, que vai se separar e criar condições semelhantes às da França, Alemanha e Inglaterra. A história não se repete. Os padrões de como algumas pessoas se desassociam e criam partidos de esquerda não permanecem. O principal é que o papel que o PASOK não assume agora, quando o movimento ataca, se manifesta e se organiza contra a Nova Democracia, esse papel deve ser assumido por nós, como temos feito até agora nas greves, em Tessalônica.

6. Conclusão

Para resumir, o anticomunismo dos grupos trotskistas não só os aproxima dos social-democratas e das políticas oportunistas da Nova Esquerda, mas também da propaganda e da prática reacionária. Apesar de seu número extremamente pequeno, não pode ser subestimado que sua vestimenta “marxista” fornece uma cobertura “revolucionária” para a ideologia burguesa dominante. A burguesia os usa, como fazem todas as correntes de oportunismo de direita e de esquerda, para subordinar as tendências radicais que surgem nos movimentos de trabalhadores e jovens.

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[0] Kyrillos Papastavrou, chefe do departamento ideológico do Comitê Central do Partido Comunista da Grécia (KKE). O artigo foi publicado na revista teórica do PC Grego Communist Epiteorisi (Revista Comunista) no 1.º de 2008. Via Politsturm, traduzido por Marcelo Bamonte Seoane e Otávio Losada, LavraPalavra.
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